7 de agosto de 2019

Valter Lemos
O CONHECIMENTO E A CRENÇA NA POLÍTICA

Todos somos de opinião que a política exige convicções. Os partidos e os políticos são, aliás, frequentemente criticados pela falta de ideias e convicções que os diferenciem, reforçando a “vox populi” que refere que “eles são todos iguais” e, assim, difundindo a ideia que a ação política é centrada exclusivamente nos interesses de circunstância e não em ideais ou convicções.
A realidade mostra-nos quase todos os dias que, na verdade, muitos políticos agem frequentemente centrados em interesses circunstanciais, não se vislumbrando ideais explicativos das suas orientações ou convicções que sustentem as respetivas decisões.
Dito assim, parece que um político que tenha convicções firmes merece confiança social e outro que não mostre tal firmeza ideológica não será merecedor dessa confiança. Ora a história mostra que a firmeza e rigidez ideológica está associada ao fundamentalismo político, religioso ou social. Hitler acreditava firmemente na superioridade da raça ariana e os atuais ideólogos islâmicos acreditam profunda e literalmente na natureza divina da organização social do séc. VII. Foram as convicções em determinadas crenças que conduziram às maiores guerras da história.
Não basta ter fortes convicções para ter uma ação política que deva merecer confiança social. A fundamentação dessas convicções é que é determinante e explicativa e não a simples existência das mesmas. Não é o nível de convicção dos políticos que garante, por si só, a qualidade das políticas, mas, sim, por um lado, a fundamentação das mesmas e por outro, a sua adequação às circunstâncias e aos problemas.
As políticas podem basear-se em duas fontes essenciais: aquilo em que acreditamos (as crenças) ou aquilo que sabemos (o conhecimento). Queremos políticos que tomem decisões baseados naquilo em que acreditam ou baseados naquilo que sabem? Queremos políticos que baseiam as suas ações nas suas convicções ou no seu conhecimento? Queremos políticos sabedores ou convictos?
Fácil é responder que queremos as duas coisas, porque, na verdade, a ação política não pode basear-se exclusivamente numa delas. Mas, sendo óbvia tal mistura, não significa que a mesma se possa estabelecer em partes iguais. Na verdade, na decisão política, mesmo que as duas estejam presentes, em última instância, há uma delas que prevalece.
Até ao aparecimento da ciência moderna nos séculos XVI/XVII a crença dominava por completo a política. Com o desenvolvimento da ciência a política foi progressivamente incorporando o conhecimento na sua fundamentação e na sua ação. As crenças foram tornando-se insuficientes para explicar decisões ou resultados e a invocação do conhecimento foi aumentando. Existem áreas das políticas publicas, como as políticas ambientais, que se desenvolveram com fundamentos já predominantemente científicos (ainda que alguns movimentos ambientalistas utilizem, por vezes, argumentos e estratégias bem mais próximos da crença do que do conhecimento).
Atualmente é fácil de constatar que as políticas públicas assentam numa mistura de conhecimento e crença que, às vezes, se complementam, mas muitas vezes são contraditórias e criam problemas e complexidades. Os radicais islâmicos usam a tecnologia do século XXI para tentar recriar uma sociedade do século VIII, Trump utiliza as plataformas tecnológicas modernas para que os americanos acreditem em conhecimento falso e as mais diversas ideologias e religiões obscurantistas utilizam a ciência e a tecnologia para difundir a crença contra a ciência e tecnologia que usam.
O tempo é, pois, confuso e complexo. Mas, há perguntas que são essenciais em política, numa democracia, e às quais nenhum cidadão consciente pode fugir. Em que se devem basear as políticas públicas? Na crença ou no conhecimento? E os políticos devem usar o conhecimento para sustentar as suas crenças ou colocar as suas crenças à prova pelo conhecimento? Quando as crenças e os conhecimentos se contradizem, devem os políticos ceder ao que acreditam ou ao que sabem?
A partir do fim da II Guerra Mundial, com o colapso do nazismo e do fascismo e o advento das teorias do capital humano, o conhecimento tem vindo a ganhar terreno na fundamentação das políticas publicas e na exigência dos cidadãos aos seus governos. Mais conhecimento traz mais democracia e mais transparência. No entanto, no século XXI tem-se assistido a um retrocesso e ao reaparecimento em força da crença como fonte das políticas públicas. As intervenções de Trump sobre as alterações climáticas são um bom exemplo disso, mas, em geral a fundamentação das decisões políticas apresentadas pelos líderes populistas apresenta essas características.

07/08/2019
 

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