João Carlos Antunes
Apontamentos da Semana...
ESTES DIAS MAIS RECENTES foram marcados pela ida de António Costa a Kiev onde se encontrou com Zelensky. Foi uma viagem que começou com algum frisson, quando o presidente Marcelo, a caminho de Timor, cometeu a inconfidência de anunciar o dia e o programa da visita, o que num país em guerra não é nada recomendável, por razões de segurança tanto da comitiva visitante, como do anfitrião. Mas no balanço da visita, todos os comentadores foram unânimes na afirmação do sucesso da iniciativa e mais uma vez se reconheceu a inteligência política de António Costa. Visitou Irpin, a cidade que defendeu Kiev do avanço do exército russo. A quase completa destruição da cidade e os muitos relatos que ouviu de violência sobre civis, deixaram visivelmente emocionado o nosso primeiro-ministro. Foi o lado humano a par da honestidade política de António Costa que não caiu na tentação, ao contrário de outros líderes que por ali o antecederam, de prometer a Zelensky a entrada rápida na Comunidade Europeia, sabendo que vai ser um processo demorado de alguns anos, mas sem negar todo o apoio técnico ao processo de entrada. E levou a solidariedade de um pequeno país europeu, com poucos recursos financeiros, mas que quer também participar no apoio à reconstrução da Ucrânia. Anunciou a doação de 250 milhões de euros, que deverão ser utilizados na reconstrução dos jardins de infância e escolas destruídas pelo exército de Putin. Serão talvez uma gota de água, mas é também de gotas de água que se faz solidariedade. O maior quinhão virá dos Estados Unidos, com a aprovação pelo congresso americano da proposta de Biden de ajuda de mais 33 mil milhões de dólares, para a defesa e recuperação da economia. No meio destes muitos mil milhões com que as democracias ocidentais estão dispostas a participar na reconstrução, pouco se tem falado das obrigações que incorrem sobre o país agressor. Os bens do estado russo e dos oligarcas apoiantes do regime, congelados na Europa, deverão ser utilizados na recuperação do que destruíram. Caso contrário, mesmo imbuídos de inquestionável sentimento de solidariedade, todos nós nos sentiremos defraudados. Com António Costa em cenário de guerra, estava o presidente Marcelo em Timor, cenário de paz e reconciliação. Terra que também foi mártir e onde os portugueses, com o presidente Sampaio a liderar, mostraram uma incomum unidade solidária de apoio à independência, contra a ocupação indonésia, numa guerra de anos, sacrifícios, perseguições e mortes. E Marcelo citou o papa Francisco “ o mundo aprendeu com o povo timorense a sarar as feridas e a virar a página da História em nome de um ideal de paz, solidariedade, coesão, diálogo, fraternidade, compromisso e crença num futuro merecido por todos”. Falar dos 20 anos da independência de Timor, é recordar também Jorge Sampaio, homem que nunca escondeu as emoções à flor da pele na luta pela causa timorense, de várias formas e de como soube mobilizar os portugueses. É um importante protagonista daquilo que agora se comemora. E os timorenses sabem-no.