Razões da emigração mantêm-se
Emigrantes vão à procura de melhores condições de vida
Numa altura em que os emigrantes portugueses se preparam para regressar aos países onde decidiram construir uma nova vida, sendo que muitos até já regressaram, a Gazeta sondou a opinião de emigrantes de várias faixas etárias.
Tendo em conta que o principal motivo da emigração é a procura de emprego, que proporcione melhor qualidade de vida, tentámos ir mais fundo na questão, comparando as experiências de quem emigrou na década de 60 com as impressões dos jovens que emigraram recentemente.
António e Rosa Martins, um casal de emigrantes portugueses, emigraram para França em fevereiro de 1969 e 1970, respetivamente. Lá, conheceram-se e acabaram por se casar, afirmando que, na altura, emigraram “para melhorar a nossa vida”.
Destacam que, em relação a Portugal, França encontra-se na liderança a nível de trabalho, por este se encontrar mais facilmente, e de dinheiro, por possibilitar melhores ordenados, revelando ainda que lá encontram “mentalidades mais evoluídas”, exemplificando que “em França só se chama doutor a quem tem o curso de Medicina, enquanto que em Portugal toda a gente é doutor e senhor engenheiro”, declara António Martins.
Já Maria Gomes diz ter emigrado para França em 1968, depois de o seu marido ter ido para lá dois anos antes. Afirma que “a vida em França é muito diferente. As pessoas vão para o trabalho mais apressadas, há mais bulicio nas ruas, há mais estrangeiros, logo, mais diversidade”, não escondendo que prefere este país. Primeiro, por ser o lugar onde tem a maior parte da família e, depois, por gostar muito da língua e cultura francesas.
Apesar destas preferências, estes emigrantes não deixam de gostar de Portugal, afirmando que “temos saudades de Portugal, porque foi aqui que nascemos”.
O clima é um dos fatores que mais marca os emigrantes, registando-se ainda outros aspetos que, segundo eles, são melhores em Portugal que em França. Maria Gomes destaca o ”bom acolhimento”, explicando que “o nosso País gosta dos estrangeiros. As pessoas são mais simpáticas, porque o País também é pequeno” o que, na sua opinião, faz com que as pessoas se conheçam a um nível mais familiar. Relembra ainda o quanto gosta de beber café na rua, pois “em França não há o hábito de tomar o café numa esplanada, por norma convidam-se os amigos para beber café em casa”.
Por outro lado, António Martins faz referência aos bons produtos portugueses como o vinho, o azeite, e o tomate, mas não sem fazer uma crítica a quotas de mercado que, a seu ver, “não fazem o País evoluir na agricultura”.
Apesar de todos estes entrevistados se encontrarem reformados, não mostram sinais de querer regressar a Portugal de forma definitiva, ou porque a maior parte da família se encontra em França, ou devido à burocracia administrativa de Portugal.
“O meu marido quer regressar definitivamente, até costuma dizer que a França já me comeu a carne, mas não quero que me coma os ossos, mas são necessários muitos papéis para podermos transferir a vida que temos em França para cá”, revela Maria Gomes. Esta faz ainda referência à segurança médica, e em como esta nem sempre funciona de forma eficiente, quando declara que “estamos habituados a um certo nível de saúde lá que não há aqui”.
António e Rosa Martins abordam a situação de forma semelhante, afirmando que preferem continuar em França, porque “cá, as coisas funcionam de forma mais complicada” e também porque o filho de ambos reside nesse país.
Apesar das críticas a Portugal, Maria Valente Sousa Nunes, outrora emigrante em França, declara abertamente que “há três coisas que nunca trocaria no Mundo: o meu País, a minha cidade e o meu marido”.
Se, no caso dos emigrantes da década de 60, a sua atual permanência no país de emigração é explicada pela família, que aí nasceu e cresceu, no caso dos recentes emigrantes, a sua opção em emigrar é largamente baseada no reconhecimento laboral e consequentes regalias.
Margarida Sampaio e Armandina Manso, de 23 e 22 anos, respetivamente, encontram-se empregadas na área de saúde, em Bury St Edmunds, Inglaterra.
A primeira revela que emigrou por várias razões, “se por um lado queria poder exercer a minha profissão e ser reconhecida pelo meu trabalho, algo que Portugal, no momento não permite, por outro sempre desejei ter a experiência de trabalhar no estrangeiro.”
Já Armandina Manso diz ter emigrado “porque em Portugal não existem vagas na área de enfermagem, e o Reino Unido, neste momento, oferece melhores condições. Acabei o curso o ano passado e esta foi uma ótima oportunidade para começar a trabalhar naquilo que quero e gosto”.
Quando questionadas sobre o que é que Inglaterra tem de melhor em relação a Portugal, a resposta foi clara de ambas as partes: “boas condições de trabalho e um bom salário”.
Armandina Manso afirma que, neste momento, o que Inglaterra tem de melhor “é o emprego na área de enfermagem”, destacando “o alojamento que é dado durante os primeiros meses de trabalho” e o “bom período de integração nos serviços”.
Por seu lado, Margarida Sampaio, sem se afastar muito da opinião anterior, dá destaque ao “investimento da instituição empregadora na formação dos seus trabalhadores e à boa qualidade de vida”.
Mas apesar das regalias, também a saudade por Portugal se faz sentir nestas duas jovens.
O clima, a comida, mas principalmente a família e os amigos são os maiores alvos desta saudade, coisas que “simplesmente damos por garantidas quando ainda estamos em Portugal, e que só nos apercebemos que nos fazem falta quando cá não estamos”, como afirma Armandina Manso.
A questão da fuga de cérebros de Portugal para o estrangeiro foi outro dos pontos discutidos, o qual levantou as opiniões tanto dos emigrantes da década de 60, como dos atuais jovens emigrantes.
António Martins é da opinião que “não é normal um país não ter trabalho para as pessoas que forma”, à qual Maria Gomes acrescenta que “Portugal devia fazer um esforço em arranjar emprego para a mocidade que gasta tanto dinheiro em estudos e depois não tem trabalho”.
Já Armandina Manso e Margarida Sampaio declaram que “Portugal está a investir, e muito, na formação de jovens altamente qualificados, para depois saírem e irem usar as suas capacidades e conhecimentos para ajudar na evolução de outros países. Acredito que, um dia, Portugal vai precisar desses cérebros, e eles já não estarão disponíveis, porque foram obrigados a sair em busca de um lugar que lhes dê o que eles querem e precisam: estabilidade e trabalho”.
Carla Nunes