Lopes Marcelo
O FAROL DO MONTE DE SÃO MARTINHO
Comemorou-se recentemente mais um aniversário da elevação de Castelo Branco a cidade, por Alvará de 20 de Março de 1711 atribuído por D. José I.
Ao longo da semana foram diversos os actos e os eventos culturais com merecido destaque para o Mestre Manuel Cargaleiro e a sua notável obra. Ao vibrar como comunidade, faz todo o sentido, celebrar a memória e valorizar a nossa história. Nesta perspectiva, no âmbito das comemoraçoes do centenário da morte de Francisco Tavares Proença júnior, fundador do Museu, foi representada no Cine-Teatro a peça de teatro baseada na sua correspondência, fruto de uma parceria entre a Sociedade dos Amigos do Museu e o VAATÃO – Teatro de Castelo Branco.
Ao longo do tempo das pesquisas fui confirmando de forma cada vez mais nítida a grande intensidade, a enorme coragem e a generosa dedicação do jovem Francisco aos estudos de arqueologia. A esta sua verdadeira vocação sacrificou a formação universitária e, contornando uma saúde débil, dedicou-se incansavelmente aos aos trabalhos de campo, à recolha e à análise de peças e artefactos antigos, tendo publicado dezenas de artigos de análise, interpretação e divulgação. Partindo das importantes descobertas realizadas no Monte de São Martinho, berço originário da nossa cidade, foi como um farol a iluminar os vestígios do nosso passado.
Arqueólogo reconhecido, premiado e com contactos internacionais notáveis no Portugal do início do século XX, seguindo o exemplo dos mestres arqueólogos franceses, assumiu como sendo o seu maior projecto, a criação e a organização do Museu. Concretizou tal objectivo à força de total empenhamento e determinação, praticamente sozinho, pouco compreendido pela sociedade da sua época e, até, pela família que lhe destinava uma distinta e próspera carreira.
A sociedade Albicastrense da primeira década do século passado era muito conservadora e marcada por famílias de grande proprietários rurais. Dominava uma elite concentrada nos seus interesses, em intensas diaputas partidárias, desligadas do desenvolvimento do território e da promoção das sua gentes. Francisco Tavares Proença Júnior rompeu com estas amarras, lançando luz sobre o passado com visão de futuro. Foi um visionário questionador das normas, sonhador de novos projectos.
Reconhecendo a enorme importância do seu legado cultural, a cidade deve prestar homenagem ao cidadão culto, ao jovem arqueólogo corajoso, a quem se deve a afirmação fundacional da arqueologia regional, com impacto nacional e internacional.
Para além das cerimónias e das palavras de circunstância, sempre incompletas e transitórias, existe uma vertente pedagógica relativa à divulgação do seu luminoso exemplo. Só se ama o que se conhece, diz o nosso povo, e a notável vida e obra deste ilustre albicastrense é ainda mal conhecida. Contribuir para o melhor conhecimento do cidadão, do arqueólogo e da sua obra, é o objectivo da peça de teatro.
Existiu um farol e importa que a sua luz não seja fechada numa gaveta, mas, antes, se revele à sociedade , designadamente às novas gerações nas escolas, como áurea cultural do passado que moldou a nossa identidade.