Edição nº 1787 - 5 de abril de 2023

Valter Lemos
A NOVA CENSURA

Nos últimos tempos tem havido notícias de “correção” dos textos de livros de autores consagrados, substituindo palavras e expressões, de forma a alterar uma “linguagem datada e desatualizada por linguagem mais inclusiva”. Isto tem vindo a acontecer em Inglaterra e Estados Unidos, onde algumas editoras e bibliotecas têm vindo a adotar tal política, sendo a mais recente polémica a relativa às alterações aos livros da famosa Enid Blyton, criadora das “aventuras dos Cinco” e dos “Sete”.
A atitude de submeter a julgamento de uns quaisquer burocratas, que nunca escreveram nada de jeito na vida, obras literárias ou artísticas reconhecidas, é tão chocante que se torna até repulsiva.
Desde logo pela intolerável arrogância que revela. Um qualquer grupo entende que só os seus conceitos culturais e morais podem ser aceites. Porque são “superiores” a todos os outros. Qual a diferença entre isto e qualquer religião? Não é assim que se comportaram ao longo da história quase todas as religiões?
Segundo as notícias, as bibliotecas do condado de Devon, resolveram esconder os livros com a linguagem original e só permitir o acesso às versões adulteradas ou, no caso de interesse de consulta das originais, os leitores terão de ser “advertidos” previamente!
Estamos, pois, perante um comportamento que vai além da simples censura, o que já seria grave. Pretende-se “reeducar” os leitores com a “única verdade” aceite. Qual é o passo seguinte? Fazer listas dos “leitores perigosos” que insistem em ler as versões originais? Queimar essas versões originais?
Vão seguir-se outros escritores? Vão “corrigir” obras de Shakespeare? Dickens? Allan Poe? Em Portugal “corrigiremos” Camões? Bocage? Camilo?
E será extensivo a outras artes? Passaremos a esconder e queimar pinturas? Ou a “corrigi-las”?
Há pouco tempo foi noticiada a demissão de uma diretora de escola nos Estados Unidos devido a ter mostrado na aula uma imagem da estátua de David de Miguel Ângelo, tendo os pais protestado porque considerarem ofensiva a nudez da mesma. Tal atitude, muito obscurantista, gerou uma generalizada critica à atitude dos pais e da escola. Mas afinal a atitude das bibliotecas e editoras inglesas não será ainda bem pior do que a destes pais?
Este comportamento censório, vindo de autoridades públicas em regimes democráticos, deve ser fortemente condenado e repudiado. A censura já é, por si mesma, um ato obscurantista contrário à liberdade e à condição humana, mas associada a uma política do pensamento único, torna-se extraordinariamente perigosa para a democracia, a liberdade e a própria condição humana.
A religião é a revelação do mundo por Deus. A arte e a ciência são a construção do mundo pelo homem. Liberdade de pensamento e de criação é a condição mais essencial a essa construção.

05/04/2023
 

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