Lopes Marcelo
OS SONS DOS SINOS
Continuando a valorizar a importância que representa o cuidar da memória colectiva de cada comunidade, enquanto pauta privilegiada da sua Identidade cultural, prossigo na abordagem do património sineiro da nossa região.
De facto, sejam considerados voz de Deus ou voz do Povo – os sons dos sinos – são bem a memória profunda do tempo, perene bandeira de identidade enquanto símbolo representativo da Comunidade que enlaça os ritmos e os sobressaltos terrenos com a ânsia do sublime e as invocações do infinito.
A profundidade e o etéreo simbolismo da voz dos sinos nos toques manuais a que os sineiros de forma generosa e ao longo da vida dedicam a sua sensibilidade musical ecoa de um modo especial na pauta mágica da poesia. Começo hoje a abordar os sinos no Cancioneiro.
Sinos da minha aldeia
Oh! Sino da minha aldeia
dolente na tarde calma
cada tua badalada
soa dentro da minh´alma.
E é tão lento o teu soar
tão como triste da vida
que já a primeira pancada
tem o som de repetida.
Por mais que me tanjas perto
quando passo sempre errante
és para min como um sonho
soas-me a alma distante,
a cada pancada tua
vibrante no céu aberto
sinto mais longe o passado
sinto a saudade mais perto.
(Fernando Pessoa)
A voz do Tempo
Na altaneira torre
a voz do tempo
em badaladas plangentes
canta o vento,
laços de identidade
a unir as gentes.
Tocam os sinos
em propósitos de fé,
sons de dor e de festas
a cadenciar o ritmo
das terrenas fainas
elevando para o alto
a humana fragilidade
em sobressalto.
(Martins Marcelo)
Passageiros aos seus lugares
Voltai sinos da igreja
Da minha aldeia, que já não existe,
A repicar de novo. Que não chorem
Os pinheiros do Passeio dos melancólicos,
Onde tu da vida me falavas,
Mãe, enquanto eu respirava como
Uma árvore…
(Jesús Fonseca Escartin)