Edição nº 1836 - 20 de março de 2024

Lopes Marcelo
PARA SEMPRE!

No contexto das comemorações de duas décadas de vida da Sociedade dos Amigos do Museu Francisco Tavares Proença Júnior na sua fase e vertente mais recente, assumo que vale a pena revisitar a vida e obra do fundador. De facto, no enquadramento da sua época, a fase final da Monarquia e os tempos conturbados da República, numa família nobre da elite albicastrense com pergaminhos políticos relevantes a nível nacional, não era de esperar que surgisse um jovem determinado que contrariou o projecto de vida que lhe era destinado pela sua família e se dedicou totalmente ao estudo e pesquisas arqueológicas que convergiram no maior acontecimento cultural da cidade na primeira metade do século passado: a criação do Museu.
A sua personalidade, a força do seu carácter demonstrado na oposição à vontade de seu pai, seguindo e concretizando as suas opções e projecto de vida próprio, permitiram que ainda jovem com vinte e quatro anos, desabafasse o seu íntimo desejo de um dia colocar a sua própria colecção ao serviço da cidade de Castelo Branco. E porque não criar-se um museu? «Ainda um dia Castello Branco há-de ter um Museu Municipal e ainda talvez um dia ali se reúnam os sabichões n´uma espécie de Congresso Nacional de Archeologia. Já estive mais longe disso.» A concretização deste seu sonho foi a vertente mais importante da sua vida, aliás curta e sofredora vida devido à tuberculose que desde muito novo o atacou e, não obstante o recurso aos melhores tratamentos da época, o venceu em 1916 com apenas trinta e três anos de idade.
O desconhecimento da vida e obra de Francisco Tavares Proença Júnior na nossa sociedade actual é injusto porque muito imerecidamente é desvalorizado e remetido para o âmbito de menino de família rica que tinha todos as condições e recursos. Contudo, considero fascinante como o jovem rompeu com o conforto, com os interesses da teia familiar e os valores conservadores da época, contribuindo de forma assinalável para o estudo e preservação do património arqueológico da nossa região, designadamente das raízes históricas da nossa cidade. Depois da peça de teatro “O Farol do Monte de São Martinho”, tenho em mãos a construção de uma nova peça em forma de monólogo que tarta a vida e a obra de Francisco Tavares Proença Júnior em que o próprio a descreve da frente para trás, com objectivos pedagógicos e didáticos, para levar o seu conhecimento à sociedade e, designadamente, às escolas. Hoje transcrevo o primeiro Quadro.
Quadro inicial – O regresso
Entre jogos de luzes e fumos, sob o manto diáfano da fantasia saído da memória que no assento etéreo se consente, a personagem de Francisco dialoga consigo própria, observando tudo na convicção de que não é visto.
Francisco: (Sacudindo o pó do desbotado fato preto e recuperando lentamente o movimento das articulações) Ah! Não é fácil passar esta fronteira…. Tenho frio. (Tosse e anda com dificuldade) Aqui estou em revisitação ao primeiro mundo em que vivi muitas e intensas viagens, anseios e desilusões. (São projectadas imagens do Museu de há um século.) O meu Museu, o Projecto da minha vida, o meu trabalho e anseio de sempre e para sempre.
É bom regressar do frio dos Alpes Suíços. Desta última vez o Dr. Spenglar não me internou em Davos e acomodei-me na simpática Vila Elisabeth em Rosiaz. (Tosse um pouco). Dediquei-me aos estudos de microbiologia cada vez com mais saudades dos trabalhos de campo das pesquisas arqueológicas. Tão longe está a minha juventude, as correrias pelos campos da Feiteira. O horizonte de luz de Castelo Branco, a alegria colorida dos rosmaninhos e das giestas na Primavera. Oh! Como sinto o apelo das raízes. O que mais me custava era não saber como estavam a cuidar do meu Museu. Era necessário elaborar o Catálogo. (São projectadas imagens/pequeno vídeo das instalações actuais).
Mas que bem instalado no antigo Paço Episcopal. Sim senhor. Tanto há para recordar e, nesta afável transparência de alma, gosto de reviver. (Abre a sua mala das viagens. Repara que em cima da mesa estão livros, designadamente exemplares da Revista Materiais, que examina com interesse.)
Que belas publicações têm feito, sim senhor! A minha Revista Materiais teve continuidade e é publicada pela Sociedade dos Amigos do Museu. (Abre a revista e faz comentários.) E, certamente, já aqui se terão reunido várias vezes os sabichões numa espécie de Congresso Nacional de Arqueologia como eu tanto almejava. O tempo não pára. O tempo é um grande escultor e gravou para sempre o maior Projecto da minha curta vida em que realizei muitas viagens, em que muito aprendi e tanto gosto de recordar. Ah! Como me é grata a inauguração do Museu. (Pensativo. A cena escurece.)

20/03/2024
 

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