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Edição nº 1837 - 27 de março de 2024

Teresa Antunes
A (MINHA) GAZETA DO INTERIOR EM 1.200 PALAVRAS

Quando João Carlos Antunes telefonou para me convidar a escrever sobre o 35.º Aniversário da Gazeta do Interior naturalmente agradeci, mas, simultaneamente, escapou-me imediatamente uma pergunta que, na verdade, foi apenas uma interrogação de mim para mim… que se soltou em voz alta: “Mas vale a pena, faz sentido falar de algo que (já) me é tão longínquo no tempo, de que soltei amarras há 24 anos?!”.
O desafio que me coloco é responder à minha própria dúvida nas palavras que se seguirem.
A Gazeta do Interior nasceu com um ADN urbano, inquieto, sem fronteiras que não pudéssemos derrubar, nem desafios que não pudéssemos alcançar. Nasceu irreverente, “com o sangue na guelra”, indisponível para vénias ou genuflexões a poderes râncios, por mais instituídos que estivessem. E com uma regra de ouro: dar voz a quem não tem voz.
Só que nasceu numa cidade de Província e provinciana, ainda que tivesse gozado de alguns anos gloriosos, prévios à hecatombe que varreu e ameaça diariamente os órgãos de Comunicação Social e os poucos que, ainda, exercem verdadeiramente o ofício de jornalista.
Visto retrospectivamente, nem o ADN (leia-se Estatuto Editorial) da Gazeta do Interior seria tão linear e generoso nos seus princípios e intenções, nem a prática tão impoluta.
Mas discorrer sobre tais hipóteses exigiria bem mais do que 1.200 palavras. Pelo que, adiante.
O que se mantém inalterado, consolidado no meu íntimo – com a distância que estes 35 anos já me permitem - é a certeza que a minha experiência na Gazeta do Interior moldou-me para a vida, como pessoa e, sobretudo, como trabalhadora.
A Gazeta do Interior reafirmou em mim os valores que aprendi dos meus pais: Honra, Trabalho, Verdade, Lealdade, Imparcialidade, Convicção no Pensamento e Determinação na Acção. Sempre com os olhos postos em quem não tem voz para se fazer ouvir.
Seguramente por isso continuo a condenar convictamente – a denunciar, se for caso disso – todos os que são tão fortes com os fracos e indefesos e são tão mansos com os fortes…
Falar do 35º aniversário da Gazeta do Interior obriga-me a vasculhar o baú das memórias. A abrir gavetas arrumadas e fechadas há 24 anos…
Foram mais de 4.000 mil dias e 4.000 mil noites partilhados com camaradas da mesma luta que, no essencial, estávamos unidos pela convicção de que o nosso trabalho fazia a diferença semanalmente quando chegava às bancas;
Foram 4.000 mil dias e 4.000 mil noites de silêncios tensos enquanto cada um de nós organizava mentalmente as palavras que eram marteladas em linguados (gíria jornalística para as folhas de papel A4 com 60 linhas, ou seriam 25?) nos teclados das máquinas de escrever (primeiro) ou nos teclados do computador (já bem mais tarde).
Foram 4.000 mil dias e 4.000 mil noites de debate de ideias, de “discussões” inflamadas pela convicção com que cada um defendia os seus argumentos, pela partilha das dúvidas e angústias que, num momento dado, afligiam alguém, ou pela intensidade das gargalhadas que ecoavam por toda redacção e, seguramente, também pela casa dos vizinhos (Luís Flipe Valente) que com sacrossanta paciência nunca expressaram um queixume… Pelo menos que me lembre.
Trabalhar na Gazeta do Interior foi trabalhar em regime non stop.
Porque essa é (era) a essência da Redacção de um jornal.
Estava um número do jornal a chegar às bancas e já nós nos preparávamos, de novo, uma semana atrás da outra, para a Reunião de Redacção que servia, essencialmente, para preparar a edição da semana seguinte.
Depois de uma primeira fase, que aos meus olhos seria uma versão tardia das sessões de autocrítica praticadas em alguns partidos políticos no PREC, seguia-se a Agenda propriamente dita: “Então, ideias para a semana que vêm?”. E lá seguíamos, quem faz o quê, quais as propostas e contributos individuais para o próximo número?
E quando menos esperávamos: “O quê, nada? Essas cabeças não pensam? Não tiveram tempo de pensar? Não têm curiosidade de saber, ninguém pensou em seguir aquilo de há três semanas…?”.
Felizmente, na Redacção, o fumo dos cigarros era sempre tão intenso, tão compacto, que às vezes tinha a sensação de que se ficasse suficientemente imóvel poderia “camuflar-me” e escapar à tempestade do momento…
Só que não. E pior. Com o passar do tempo despertou e cresceu em mim um gosto inquietante por aquele momento, em que tudo recomeçava. Um gosto desafiante em expressar a minha opinião e lutar por ela. Um gosto quase autofágico de escrever sobre os temas mais “delicados” que vinham parar à Redacção.
Nos anos de trabalho na Gazeta do Interior, comparável às reuniões de Redacção, só mesmo o fecho do jornal se igualava em adrenalina e stress.
Porque os momentos de verdadeiro crescimento profissional – e pessoal – aconteciam em outros registos. Às vezes nos mais improváveis.
Se bem que a Política tinha um peso muito grande (o maior?) na Gazeta do Interior daqueles tempos, as estórias (de vida, de alguém, de alguma entidade ou instituição, de um caso humano) eram o contraponto neste jogo de equilíbrio que todas as semanas procurávamos para o jornal.
E é aqui que entram os maestros desta pequena orquestra – pequena mas afinada e de préstimos inegáveis –: Afonso Camões e Joaquim Duarte.
Foram eles que, ombro com ombro, fundaram a Gazeta do Interior.
Foram eles, cada um no seu estilo e, na minha lembrança, com métodos quase diametralmente opostos, que me ensinaram quase tudo o que sei deste tão nobre ofício do jornalismo.
Nos bancos da Faculdade aprende-se. Eu sei, passei por lá.
Mas é com profissionais da tarimba de Afonso Camões e de Joaquim Duarte, ali no coração das redacções compostas por profissionais da informação, que qualquer aspirante a jornalista se empapa do saber fazer, da curiosidade que todos os que somos jornalistas temos de ter.
Eu serei sempre jornalista, olho para o Mundo com os meus olhos de jornalista, muito embora não exerça a profissão há 24 anos.
E foi com estes dois homens – passados tantos anos já me atrevo a olhar para eles de igual para igual, como camaradas de profissão – que aprendi o ofício. E foi uma aprendizagem que me permitiu fazer o caminho até ao fim: dois anos de estágio, a que se seguiu a obtenção da Carteira Profissional cujo número sei de cor, como o do Cartão de Cidadão, Jornalista, Chefe de Redaccão e Directora da Gazeta do Interior.
Até que, para mim, o projecto morreu. Porque deixei de acreditar, porque não fazia mais sentido, porque havia (há sempre) tantos outros caminhos para trilhar.
Era uma jovem mulher e, pela primeira vez, escolhi abandonar o poder que era inerente aquele cargo/função.
Sim, abandonei o poder do cargo/função. Não abandonei a responsabilidade. Essa acompanha-me em todos os outros trabalhos e projectos que, até ao momento, integrei ou integro.
Sim, abandonei o poder do cargo/função e, nesse momento, escolhi o meu lado da trincheira na vida que me cabe viver.
Hoje, abri o baú das recordações, felizmente, com número de caracteres máximo pré-definido e limitado.
Porque, para o bem e para o mal, a minha passagem pela Gazeta do Interior permitiu-me conhecer global e pormenorizadamente este território – e tantos outros -, como poucos terão o privilégio de conhecer, porque me permitiu testemunhar e fazer parte de momentos e acontecimentos únicos e irrepetíveis, porque me permitiu privar com pessoas ímpares – por boas e más razões – que seguramente deixaram marcas em quem sou, influenciaram os reptos que aceito e os que desprezo, porque me deu uma capacidade de observação, de análise, de correlacionar factos, de perspectivar acontecimentos que dificilmente teria sem esta experiência profissional.
A todos com quem privei durante aqueles anos o meu bem-haja. Não me refiro explicitamente a vós porque não cabeis em 1.200 palavras. A excepção, todas as regras, ainda que autoimpostas, a têm, é para Paulo David, de quem guardo a solidão do olhar e a imagem de uma lindíssima Madonna, que me ofereceu uma das últimas vezes que nos vimos e que me acompanha até hoje.
O resto… Bom o resto é um abraço do tamanho do Mundo para o Afonso Camões e para o Joaquim Duarte. Um abraço onde cabem todos aqueles de quem não falo, mas que tenho a certeza sabem quem são.

27/03/2024
 

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