16 julho 2014

Maria de Lurdes Barata
O STRESS DO ALTIFALANTE DO SERVIÇO DE URGÊNCIAS DE CASTELO BRANCO… E OUTROS ALTIFALANTES

Estava a acompanhar uma senhora idosa, minha amiga, na Urgência do Hospital de Castelo Branco. Já passara pela triagem, esperava, ela esperava com a pulseira amarela, eu esperava com a pulseira roxa de acompanhante, eu remirava, curiosamente era mesmo da cor das minhas unhas, nem de propósito. Tornava a remirar para enganar a espera e para afastar um pouco os queixumes de dor da minha amiga. Sala cheia. Sempre a entrar gente. Uma senhora na maca defronte torcia-se em esgares e voltas ao corpo. A fila de cadeiras ocupadas, encarreiradinhas junto à parede, com rostos de olhar fixado nos rostos das cadeiras ocupadas, encarreiradinhas junto à parede em frente. Olhares sérios, de espera, devolvendo olhares cúmplices. Berra uma criança também em espera. «Já vai ser chamada, é só mais um pouco», replicava eu para a impaciência da dor da minha amiga.
Um stress, primeiramente atribuído à espera, começava a crescer cada vez que se ouvia o altifalante para chamar um nome. Que nome? Era ruidosamente roufenho, rápido, seco, irritante, imperceptível. «Quem chamaram? Não percebo nada!» perguntei, aflita, à senhora do lado. Traduziu parte do nome. «Percebe?!»; «Já estou aqui há muitas horas…». E foi-se repetindo o som tenebrosamente fanhoso, impossível de entender, e foi-se repetindo o meu pedido de tradução. Cada vez que ouvia o click que iria iniciar o indiferente ronco breve e fanhoso, o meu stress aumentava. Outra vez. Nome de senhor, o da cadeira de rodas, que chegara há quinze ou vinte minutos. Um funcionário do hospital começou a empurrar a cadeira, voltou-se para mim e perguntou: «Qual o nome da sala (ou balcão?) que disseram?» É que a seguir ao nome diziam o número da sala de médico a que a pessoa devia dirigir-se. Eu, já agressiva, respondi: «Mas alguém entende alguma coisa?! Este sistema sonoro ultrapassa tudo o que se pode imaginar de pior! As pessoas têm de reclamar!»
Eu já tinha experiência de outros altifalantes em sala de espera de consulta externa, também deficientes, mas deduzia-se um nome por uma ou outra sílaba mais aberta. Aqui, não! Fui refilando entre dentes, irritada, ameaçando que ia reclamar por escrito… Um tempo sem microfone! Lá chegou o som roufenho desconjuntado com nome e sala. A minha tradutora elucidou—me com um «parece que é este nome…». O nome da minha amiga! E a sala? Isso ninguém tinha entendido. Um funcionário: «deve ser a última». Espreitei, perguntei à médica que vi ao fundo, atrás da secretária. Era mesmo. Pus-me a reclamar do malfadado altifalante, «uma vergonha».
Parece, a quem me ler ou a quem me ouvir contar o incidente, que é de somenos importância, que sou uma exagerada. Não é! Bem basta a espera, a espera que parece interminável, a minha durara quase duas horas e meia…  com o espaço do serviço de urgência avolumando progressivamente de gente e gente. No entanto, para quem sofre esta espera, o altifalante que faz esticar a orelha é mais um pormenor a aumentar o stress, como sal quanto basta salpicando uma ferida. É assim tão difícil um conserto deste sistema de som? Ou a sua substituição?
Acabo de fazer a minha reclamação pública.
OUTROS ALTIFALANTES. Posto que falei de um altifalante de stress num serão de stress na Urgência do hospital, a minha caneta encontra outros altifalantes, última tecnologia, de ampliação clara de voz que se torna poderosa pelo que tem de audível, invadindo o coração e a cabeça, despertando bons e maus sentimentos pelo efeito das palavras.
Entendemos claramente o que vem de voz de palco de microfones de rádio, de  televisão, de reuniões ajantaradas, vozes que nos trazem vacuidades de discursos enganosos, de negociatas adjectivadas de boas oportunidades, só desfavorecendo os que já pouco têm, da necessidade de continuar o rumo governamental, das promessas a que os cidadãos já não ligam porque estão fartos de ser ludibriados, de retomas que é retomar-se em proveito próprio ou em agrado ao exterior, do crescimento económico que é crescimento financeiro só para alguns -  eis peças de palavras ditas ao microfone, peças de um lego que se desmorona na acção necessária, sem base de apoio seguro para o bem comum. Os microfones levam-nos vozes misturadas em Torre de Babel, afastando os portugueses da participação democrática, devido ao desânimo duma impotência que os tem esmagado.
Hoje falei só de altifalantes de stress!

16/07/2014
 

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