GAZETA FALOU COM O DIRETOR DA PROVA
A Volta a Portugal em Bicicleta vista por Joaquim Gomes
Gazeta do Interior (GI): Qual é a importância que considera que a Volta a Portugal em Bicicleta tem para o País, em geral, e para a Região de Castelo Branco, em particular?
Joaquim Gomes (JG): No contexto nacional, e no fundo isto arrasta-se também para a Região de Castelo Branco, esperamos um evento de referência, já com mais de 86 anos de história e que, obviamente, ocupa um lugar muito especial no nosso imaginário. Desde há muitos anos que culturalmente os valores da Volta são transmitidos de geração em geração, sempre presente na mente dos portugueses, que têm uma apetência e um carinho muito especial por este evento. No contexto de Castelo Branco, no fundo é exatamente a mesma situação.
GI: Joaquim Gomes já tinha alguma ligação com esta região?
JG: Conhecia a Região (Beira Baixa) enquanto ciclista e durante esse tempo tive a oportunidade de terminar, começar e passar, em diversas etapas da Volta em Castelo Branco. Porém, de há alguns anos a esta parte e a nível pessoal, passei a ter uma ligação mais forte com esta Região, porque os meus sogros são da aldeia histórica de Monsanto, no Concelho de Idanha-a-Nova, e visito-os com frequência. Para além disso, tenho uma excelente relação com os autarcas e com a Associação da Carapalha, de Castelo Branco, onde faço questão, a convite, de participar nalgumas atividades, nomeadamente passeios de cicloturismo, que são organizados com alguma regularidade.
GI: Ao comparar com outras grandes Voltas, como o Tour de França ou o Giro de Itália, em que patamar colocaria a Volta a Portugal em Bicicleta?
JG: São duas questões distintas, com duas perspetivas de análise também distintas. A Volta a Portugal em Bicicleta é um evento a nível nacional e considerando que estamos a falar de um país, que quer queiramos, quer não, é periférico, teve um crescimento a par da evolução da própria sociedade portuguesa.
Para os portugueses a Volta é similar, efetivamente, àquela que o Tour representa para os franceses, ou o Giro de Itália para os italianos. Acontece que atendendo aos estilhaços que a flutuação económica, nomeadamente desta crise que nos afeta e que porventura vai continuar a afetar durante mais algum tempo, em termos de mediatismo internacional, a Volta a Portugal em Bicicleta, neste momento, não está no patamar que já ocupou no passado, onde muitas equipas portuguesas participaram, inclusivamente na Volta a França. Este fator, e atendendo ao próprio comportamento e às dificuldades das equipas nacionais, obrigou-nos, aos organizadores e à própria Federação Portuguesa de Ciclismo, a tomar decisões relativamente ao nível das equipas. Assim, decidimos, que não iríamos colocar equipas internacionais a competir diretamente com as nossas, até porque o ciclismo português continua a ser influenciado negativamente no panorama internacional por causa da sua periferia.
GI: Qual a sua opinião sobre o atual estado do ciclismo português, quer a nível individual, quer a nível das equipas?
JG: Felizmente e ainda no contexto da nossa periferia, temos conseguido encontrar soluções para estarmos bem melhor, por exemplo, que os nossos vizinhos espanhóis. Digamos que o ciclismo profissional português poderia perfeitamente sobreviver sem recurso a equipas estrangeiras. Poderíamos fazer uma Volta a Portugal em Bicicleta, neste momento, só com equipas portuguesas.
Ao nível dos valores individuais, o contexto económico difícil obrigou a que os nossos melhores valores emigrassem, mas, felizmente, estão a demonstrar-se e a impor-se a nível internacional, o que acaba por arrastar benefícios para o ciclismo português.
GI: Joaquim Gomes foi também um grande ciclista do panorama português. De que forma incentivaria os jovens portugueses para a prática desta modalidade?
JG: Muitas vezes para a prática de uma modalidade tão exigente e tão absorvente como é o ciclismo de estrada, não basta ter os conselhos que os pais, os avós e porventura os de alguns notáveis da modalidade podem oferecer. É precisamente por isto, que é preciso que os futuros praticantes tenham focos e objetivos que com firmeza ajudem estes potenciais ciclistas e refi- ro-me concretamente aos escalões de formação, a entregarem-se de corpo e alma na perseguição desses objetivos. Mas para isso são precisos motivos aliciantes, que façam nascer a paixão por esta modalidade. Neste momento, continuamos a ter um evento como a Volta a Portugal em Bicicleta, que é, efetivamente, o grande palco para qualquer praticante e a existência de grandes campeões atuais como é o caso do Rui Costa, Tiago Machado, entre outros, que acabam por desempenhar um papel fundamental na captação de potenciais praticantes para a modalidade. Este fenómeno está assim, perfeitamente salvaguardado, não havendo preocupações para o ciclismo a este nível.
GI: Se tivesse que descrever a Volta a Portugal em Bicicleta em poucas palavras, como o faria?
JG: É evento equilibrado e que apesar de 86 anos de história continua a surgir renovado, apresentando, por exemplo, três estreias de municípios que nunca tinham sido apresentados como palco de inícios ou de finais de etapa, concretamente, Montalegre, com a chegada ao Larouco, Boticas, com partida de etapa, com a chegada à Senhora da Graça e por fim Oleiros, que imediatamente a seguir à chegada de Castelo Branco, vai servir de palco de partida à etapa de contrarrelógio. Tudo isto é um motivo de orgulho para a nossa organização.
De resto, os locais míticos, como a Torre, na Serra da Estrela, a Senhora da Graça, e a Senhora da Assunção, em Santo Tirso, estão todos presentes e as maiores expectativas estão especialmente reservadas para a chegada a Montalegre, especificamente à Serra do Larouco.