Fernando Raposo
A mentira tem a perna curta
Enquanto Paris chora as suas vítimas, que também são as nossas, dos atentados do passado dia 13 e Bruxelas se mantém vigilante quanto ao risco dos terroristas, por cá, Cavaco Silva entretém-se a “esticar” o tempo, apenas para adiar a solução em que ele próprio se deixou enredar.
António Costa, avisara, ainda durante a campanha, que não viabilizaria um governo minoritário da direita. Disto, a imprensa fizera eco e aqueles que votaram no Partido Socialista terão percebido o recado e os restantes partidos envolvidos na “contenda” não terão feito, certamente,”orelhas moucas”.
Por isso, as expressões utilizadas, embuste e fraude, com que a direita tem brindado o entendimento do PS com os partidos à sua esquerda são despropositadas e revelam uma visão sectária do espectro político.
A esquerda, em particular o Partido Comunista, mudou, e muito, desde o célebre comício da Fonte Luminosa, em 1975, em que Mário Soares rompeu com o PC e fez frente ao radicalismo. Desde essa altura, o Partido Comunista elegera o Partido Socialista como o seu principal inimigo.
O diálogo à esquerda era assim imprevisível.
Por detrás desta mudança estarão porventura muitas razões, mas de entre elas não terá sido indiferente o desprezo com que a direita extremada tratou, nos últimos anos, a generalidade dos portugueses. Foram tempos muito austeros e penosos, cujas principais vítimas foram, e continuam a ser, aqueles que os partidos de esquerda sempre defenderam.
Foram tempos em que, por razões ideológicas ou por tacticismo, a direita mais conservadora de que há memória se furtou ao diálogo e fez da arrogância e da mentira companheiras de viagem.
Foram Passos e Portas que despertaram o Partido Comunista e também o Bloco de Esquerda para uma maior consciencialização de que o diálogo, o consenso e a construção de soluções de governabilidade à esquerda podem representar para benefício para a maioria dos portugueses.
Cavaco Silva foi surpreendido pela audácia da esquerda e terá ficado muito irritado. Razão pela qual, corridos que são mais de cinquenta dias, contados desde as legislativas, em Belém ainda se não avista fumo branco.
Talvez Cavaco Silva se tenha convencido, agora que está em fim de mandato, que, protelando a decisão (e qual é pressa, se o país tem os cofres cheios), António Costa se dê por vencido pelo cansaço de tanto esperar e Passos e Portas se vão aguentando, em gestão, até que o próximo Presidente da República dissolva o Parlamento e convoque novas eleições.
Enquanto a coisa não se resolve e o governo está em banho-maria, a mentira que, como o povo diz, tem a perna curta, mais dia, menos dia vem ao de cima.
Afinal de contas, a devolução de grande parte da sobretaxa do IRS, que o governo de Passos e Portas anunciou durante a campanha, já não vai ser efectuada. Propaganda, apenas propaganda, para convencimento dos mais incautos. E muitos, não tantos como em 2011, ainda caíram uma vez mais no conto do vigário. Isto sim, foi um embuste.
Conforme nos dá conta o jornal Expresso, com a venda, muito apressada, da TAP, e caso o negócio dê para o torto, o risco da dívida aos credores recai sobre o Estado. Apesar de, neste caso, conforme se refere na notícia, o accionista perder o dinheiro injectado na companhia, o negócio é apetecível para qualquer investidor, mesmo que esteja de tanga. Para Catarina Martins, porta-voz do Bloco de Esquerda, “a venda da TAP é uma nova parceria público-privada, … é um todo o risco para o público, todo o lucro para o privado” (jornal I, 21 de Novembro). Será mais uma conta que todos teremos que pagar.
É bom que Cavaco Silva se apresse, porque a mentira tem a perna curta.