Fernando Raposo
Passos e o seu Governo são os Culpados
Não fosse a arrogância e o egoísmo de Angela Merkel e a subserviência acrítica dos governos dos países intervencionados e hoje o Syriza, formação da esquerda radical grega, não teria razões para festejar tão retumbante vitória, nem Pablo Iglésias, líder do Podemos em Espanha, esfregaria as mãos de contente como se o Palácio da Moncloa já estivesse ali ao virar da esquina. O desfecho eleitoral na Grécia era mais do que previsível. Estou até em crer que o momento em que Mário Draghi disparou a “bazuca”, quatro dias antes das eleições legislativas na Grécia, não foi inocente e tinha como primeiro objectivo reverter a tendência do voto no Syriza, e conter, tanto quanto possível, os danos na Nova Democracia que diligentemente acolheu as instruções de Merkel e de Bruxelas, fustigando o povo grego até à exaustão. Tanto os gregos, como os portugueses, viram partir muitos jovens em busca de trabalho; o desemprego tem sido implacável, atingindo níveis inimagináveis. De acordo com Paul Krugman “a recessão grega atingiu o pico no ano passado, com níveis de desemprego acima dos 28%” (Dinheiro Vivo, 26-01). No desemprego jovem, o valor atingiu os 60%. Muitos viram as suas vidas destroçadas. Apesar dos sacrifícios a que foram sujeitos, a dívida grega não parou de aumentar, estando agora, segundo os dados mais recentes, em 177% do PIB.
A crueldade, sem limites, dos sacrifícios impostos aos gregos, em que cada um foi abandonado à sua sorte, ditou o resultado das eleições, em que a Nova Democracia e o seu líder, Antonis Samaras, foram severamente penalizados.
Também por cá, como na Grécia, os portugueses foram vítimas da mesma crueldade. Muitos perderam o emprego, a casa e vivem hoje abandonados à sua sorte e sem qualquer apoio do Estado. Segundo os dados da PORDATA, o desemprego era, no final de 2013, de 16,2%, atingindo mais as mulheres e o desemprego jovem atingiu os 38,1%. Muitos, a mando de Passos Coelho, emigraram. Na Administração Pública, o desemprego foi ainda mais acentuado, tendo perdido nestes últimos anos 79.898 trabalhadores (André Freire, Público, 21-01).
Tudo por teimosia de Passos, que desde sempre “ameaçou” querer ir além da Troika.
Também por cá, como na Grécia, se morre por falta de assistência médica. Foram muitos os idosos que este ano faleceram nas urgências de hospitais depois de longas horas de espera. Não morreram por causa da gripe, mas sim porque Passos e o seu governo fizeram cortes cegos, fragilizando o Serviço Nacional de Saúde (SNS). Hoje morre-se mais porque o serviço de saúde público foi desmantelado e não tem agora capacidade de responder em tempo útil e de modo eficiente. António Arnault, fundador do SNS, acusa o governo “de ser o responsável por algumas das mortes que ocorreram nas urgências (negócios online, 23-01).
Hoje é claro para todos os portugueses, que Passos e o seu governo são os culpados.
Não fosse o fanatismo ideológico, a teimosia e a impreparação de Passos e do seu governo e hoje a dívida pública não seria a mais elevada de sempre. De 2011 para cá a dívida cresceu de 108,1% para 130% do PIB (valor que se prevê no final de 2014), apesar dos inúmeros sacrifícios exigidos a todos os portugueses e da privatização das principais empresas nacionais ( ANA, CPCarga, EDP, REN, CTT).
Ao arrepio dos inúmeros apelos que têm vindo de vários quadrantes políticos e sociais e de personalidades independentes, pela importância estratégica que a TAP representa para o país, Passos insiste teimosamente em desfazer-se dela. Nos bastidores, entre os seus não menos fanáticos correligionários, urdem a teia para privatizar também a água e há quem nos sopre aos ouvidos que também querem privatizar o lixo. Mas este não que é nosso, é de cada um de nós, e devemos fazer dele o que nós quisermos. Se com ele querem fazer negócio, terão de nos pagar um bom preço.
Ao que estes rapazes chegaram!
Nosso, dos portugueses, já pouco nos resta. Apenas dois ou três caixeiros do retalho. Aquilo que se verificou com o negócio da PT, deveria envergonhar a grande maioria dos investidores portugueses. Refiro-me aos grandes, não aos pequenos. Privatize, senhor primeiro-ministro, privatize, que os grandes investidores portugueses têm revelado um enorme e irrepreensível sentido de Estado.
Se tem dúvidas, pergunte a Ricardo Salgado do BES, a João Rendeiro do BPP, ou a Oliveira e Costa do BPN ou a Henrique Granadeiro e Zeinal Bava da PT e a tantos outros, que todos eles deram bem conta do recado.
Se dúvidas ainda persistissem sobre o rumo que Passos e o seu governo têm vindo a prosseguir, lançando o país na miséria, as medidas mais recentes do Banco Central Europeu (BCE), já apelidadas de”Bazuca de Draghi”, deveriam fazê-los corar de vergonha e se decoro ainda houvesse já teriam partido de malas aviadas.
Porque as medidas de Draghi contrariam as imposições de Merkel e tudo aquilo que Passos tem vindo a defender e a aplicar. É pois tempo de aproveitar esta oportunidade, em que o BCE disponibiliza 1.14 biliões de euros, ao ritmo de “60 mil milhões de euros mensais de compras de dívida aos bancos”, injectando dinheiro novo (Luís Reis Ribeiro, Público, 23-01), fazendo investimento público e privado, fazendo crescer a economia, criando emprego e aumentando assim o poder de compra.
Não foi exercício que não tivesse sido sugerido ao primeiro-ministro, por tantos e tantos especialistas na matéria. Mas preferiu fazer de conta que não ouviu e o país está hoje mergulhado na maior crise de que há memória.
Se não fosse a arrogância e a prepotência da Alemanha e a atitude submissa de Passos, o país teria sido poupado a tanta crueldade.