Celeste Capelo
A FESTA
A Quaresma, advento da ressurreição de Cristo, a Páscoa, era chamada apenas e só A FESTA.
A palavra FESTA significava tudo, desde o religioso, à tradição, à gastronomia, à memória etc.. De facto nestas regiões do interior as festas das aldeias começam a seguir à Páscoa. Aqui bem perto de nós as mais significativas, ainda que haja outras, são 15 dias depois da Páscoa, a Sra. de Mércoles e a Sra. do Almortão.
A FESTA tanto quanto eu me lembro dos meus tempos de criança e adolescente era revestida de grande alegria, não tanto pelo seu significado religioso, devo confessar, (para os da minha idade naquele tempo) mas, porque após os 40 dias enfadonhos que se seguiam ao Carnaval, sabíamos e estávamos desejando que chegasse A FESTA.
Lembro-me que em minha casa, a telefonia só transmitia música clássica e música sacra que, nesse tempo, eu achava bem enfadonha. Depois, as restrições de não se comer guloseimas porque estávamos na quaresma, não tocar o gira discos porque estávamos na quaresma, não vestir roupas claras (para os de mais idade), porque estávamos na quaresma, fazer sacrifícios (comer sopa ao almoço e ao jantar) porque estávamos na quaresma, enfim uma série de restrições que, nós naquelas idades, não percebíamos e, também, porque o rigor imposto pela Igreja era pouco flexível.
Nas casas faziam-se as limpezas da Páscoa. Caiar as paredes, esfregar o chão com sabão amarelo, lavar cobertores, mudar a palha dos colchões para estes serem também lavados. Mas tudo tinha de estar pronto antes da 5ª feira Santa, porque a partir desse dia já não se podia lavar roupa.
Mas havia o reverso da medalha, se assim se pode chamar, e era uma alegria porque estávamos desejando que “aparecesse a aleluia”.Era no sábado à meia noite, hora a que já estávamos a dormir. Mas no domingo de Páscoa estreávamos o vestido novo, o sapato de verniz, o soquete arrendado. Ah! Que 40 dias tão longos!... Nunca mais era hora de estrear a roupa nova, de comer o bolo de festa que já tinha sido feito na semana santa.
A felicidade e a alegria que se sentia nestas coisas tão comezinhas têm afinal, e por analogia para os que crêem, a felicidade e a alegria na ressurreição de Cristo.
Certamente haverá estudos antropológicos que nos podem explicar estes, e outros comportamentos usuais nesta altura do ano, que serão certamente diferentes de região para região.
Como gostaria de ter tempo para ler e investigar estes e outros comportamentos sazonais, por este e outros motivos, que são ainda hoje práticas em muitas regiões do país.
Este período está encerrado, este ano. Mas começam agora as Festas e Romarias nas nossas terras do interior, já não tão genuínas como antigamente, mas ainda assim se organizam as comissões de festa, os mordomos, o cortejo de oferendas e vamos continuando para manter as tradições.
Também já é tradição esta crónica mensal, que partilho com todos os leitores da Gazeta do Interior.