19 de abril de 2017

Maria de Lurdes Gouveia Barata
A COLONIZAÇÃO DA LÍNGUA PORTUGUESA

Não basta dizer que se ama a sua língua. É preciso apresentar provas do amor que se apregoa. Para além das palavras, que são importantes, querem-se actos, porque os actos confirmam, ou não, o amor.
No que à língua portuguesa diz respeito há uma listagem de actos demonstrativos de falta de amor. Falo já em desamor. Mais grave ainda é referir a indiferença dos alheados, dos que se deixam arrastar pelas ondas de certos momentos. Ser-se negligente perante a sua língua materna torna-se crime de lesa-pátria, porque não existe nação sem língua, sem uma identidade que vem de memória preservada, de que a língua oral ou escrita é guardiã.
Poderia começar pelo polémico acordo ortográfico – que me nego a seguir – e pelas muitas palavras que se tornaram ondas de forte rebentação contra os defensores do famigerado acordo. Se há reversão necessária é a deste (des)acordo que emergiu de medidas apressadas e inconsistentes. Num artigo publicado no jornal Público em 7 de Maio de 2016, José Pacheco Pereira refere o seguinte: «O acordo ortográfico não é ciência, nem lei, é política. Como política é prejudicial à nossa cultura a nível nacional e como elemento de política externa é um acto político clamorosamente falhado e cujas consequências do seu falhanço caem essencialmente sobre Portugal. O Presidente teve a coragem de levantar o assunto, convinha dar ao seu acto a força da opinião pública».
               Todavia, o que me levou a escrever é um outro assunto e volto a perguntar: como se ama a língua? Com responsabilidades de professora da área, sempre exemplifiquei o amor que se lhe deve com o aprender, compreender, falar e escrever correctamente. Pessoas que arcam com o peso do exemplo não a falam, nem a escrevem correctamente. E nem se importam nada com isso, porque a ignorância é sempre atrevida e sem vergonha, uma vez que não se tem consciência da própria ignorância. E não sou uma purista da língua, uma vez que esta vai evoluindo com o falar. Falo sobretudo da adulteração que a faz corromper através de estrangeirismos desnecessários, embora concorde que precisamos de alguns para tornar mais eficaz a comunicação. Ponho sobretudo em relevo os anglicismos que se usam desaustinadamente como moda… Pedantismo por se achar que é fino? Provavelmente esses foram a um briefing (reunião breve) sobre moda e lifestyle (estilo de vida) de que vão fazer report (relatório), ou a uma reunião mais longa com coffee break (intervalo para café) dando importância a um look (visual) a apresentar aos outros. São fashionvictims (vítimas da moda) lamentáveis… Tudo cool (fresco, legal, atraente), com temperamento light (fraco, débil)… como como não podia deixar de ser… Irrita-me sobremaneira ver designações como Rosa’s Bar  (Bar da Rosa) (deparei com tal em viagem, mas também há por perto…) ou Hair Salon (Salão de Cabeleireiro). Apenas alguns exemplos ou nunca mais acabava.
É devido que se esclareça o seguinte: os estrangeirismos podem ser utilizados devido ao facto de aparecerem realidades novas para as quais não exista designação apropriada na nossa língua. Às vezes, é mesmo preferível recorrer à importação de palavras. Há, porém, uma proliferação exagerada, diria até ridícula, de anglicismos, porque o inglês impera numa cultura globalizada, que apaga raízes culturais próprias. Em determinados sectores inverteram-se os termos: é o léxico português que aparece em termos residuais e não o contrário – a pujança deveria pertencer à língua portuguesa, o nosso idioma. Não foi uma colonização imposta, foi uma adesão a ser colonizado.
Romain Gary convoca uma reflexão: «Patriotismo é o amor pela nossa Terra. Nacionalismo é o ódio à Terra dos outros». Acrescente-se Johann Fichte: «A língua de um povo é a sua alma». Defendamos então a alma com patriotismo! E termino com a velha frase de Fernando Pessoa: A minha pátria é a língua portuguesa.

19/04/2017
 

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