Carlos Semedo
CULTURA E INTERIOR
Com algumas intermitências, vivi sempre no chamado interior do país. As oportunidades de sair daqui, sempre me pareceram menos apelativas do que o conjunto de vantagens que ainda hoje reconheço a este território: bons ares, segurança, acesso aos serviços essenciais e, mais recentemente, boas acessibilidades viárias (as ferroviárias foram melhoradas na linha, para serem lamentavelmente destruídas com um serviço de Intercidades, que se confunde com um Interurbano). Claro que a minha permanência só se tornou viável porque, tirando um episódio de desemprego durante cerca de um ano, pude desenvolver uma actividade profissional de forma estável, embora com variações de empregador.
Ciclicamente, o tema do interior volta à discussão na esfera pública e política. Reconheço que estou um pouco cansado da “discussão” e esse facto é perigoso. O cansaço pode levar à apatia e desinteresse e estes conduzirem ao agravamento de alguns factores que, conjugados, têm aumentado o despovoamento que se sente um pouco por toda a faixa raiana. Desde há muito tempo que se fala em descentralização, regionalização ou desconcentração, mas a realidade é que o país continua perigosamente colado a uma máxima cada vez mais poderosa: há Lisboa e o resto é paisagem. As razões que conduzem a esta realidade são complexas, todos o sabemos, mas questiono-me sobre esta nossa incapacidade de pensar o território como um todo e, consequentemente, agir de forma consensual, no plano político, o que pressupõe um não condicionamento com os ciclos eleitorais.
Na minha área de acção predominante, a Cultura, a esmagadora maioria do investimento já passou a ser, há muitos anos, das autarquias, cabendo à Secretaria de Estado ou ao Ministério um papel que não consegue, de forma alguma, acompanhar a evolução do tecido cultural do país. Em muitos momentos do passado recente, a redução do orçamento para a Cultura, colocou-nos num patamar de indigência no que respeita ao investimento público. Essa é uma realidade altamente penalizadora para as estruturas e pessoas que desenvolvem o seu trabalho no interior do país e se repararmos na distribuição de apoios às artes, a mesma reflecte o centralismo e fixação em Lisboa. São muitos os municípios que investem de forma consistente e alguns assumem mesmo a Cultura como um dos eixos primordiais de investimento, mas a responsabilidade do Estado Central é, também Constitucionalmente, de primeira grandeza e o mesmo não tem conseguido da resposta cabal à evolução do país nesta área.
Claro que vou continuar a dar o meu melhor, a nível pessoal e institucional, para que, no território onde desenvolvo a minha actividade, a Cultura, as Artes e os Artistas estejam em permanente diálogo com as pessoas, mas precisamos urgentemente de uma afirmação, por parte do Ministério da Cultura, de uma política que seja um suporte, financeiro e simbólico, e um exemplo de olhar sensível e atento relativamente aos territórios mais necessitados.