Valter Lemos
O GOVERNO, A COESÃO TERRITORIAL E O INTERIOR
A ação do Governo que terminou o seu mandato em Outubro foi genericamente reconhecida de forma muito positiva pelos portugueses como provam os resultados eleitorais.
Esse governo tinha no seu programa um objetivo designado por “promover a coesão territorial e a sustentabilidade ambiental”, matérias que foram aliás objeto de frequentes discursos e intervenções políticas. Mas o Governo foi mais longe do que os simples discursos e criou mesmo uma secretaria de Estado da valorização do interior. E reforçou esse sinal colocando tal estrutura governamental em Castelo Branco!
Chegados aqui temos de reconhecer que, na sequência de tais medidas, nada se alterou no interior. Não foram criadas ou implementadas novas políticas públicas para a valorização do interior, nem mesmo se vislumbraram intenções de medidas significativas para o efeito. Neste caso aplica-se mesmo a frase “tudo como dantes no quartel-general em Abrantes” ou em Castelo Branco!
Esta constatação, que encerra naturalmente uma apreciação critica, conduz-nos a perguntar porquê?
Tanto mais que tais sinais foram reforçados pela nomeação, para a secretaria de estado, de um homem do interior, João Paulo Catarino, reconhecidamente capacitado e com currículo feito como presidente da câmara de Proença-a-Nova e a quem é conhecida vontade e intenção de defesa do interior. Então porquê um resultado tão pífio em tal política?
Mesmo os mais acérrimos defensores das políticas do anterior governo não podem deixar de reconhecer que os resultados concretos obtidos estão muito longe das expetativas criadas. Criar uma secretaria de estado, sediá-la em Castelo Branco, nomear um quadro reconhecido no interior, são medidas que criam expetativas elevadas acerca das medidas de política esperadas.
Apesar dos fracos resultados, ou talvez por isso, o novo governo insiste e reforça a estratégia. Não só mantém a secretaria de estado da Valorização do Interior como nomeia novamente um quadro, Isabel Ferreira, proveniente e com ação reconhecida no interior (agora Bragança). Não sabemos se se mantém também a estratégia (?) de colocar fisicamente a secretaria de estado no interior, mas não parece haver sinais disso.
Mas, o governo vai mais longe e cria um ministério da coesão territorial. E escolhe uma ministra, Ana Abrunhosa, também com currículo na matéria pelo desempenho de funções na Comissão de Coordenação e de Desenvolvimento Regional do Centro.
Tal decisão não pode deixar de ser saudada por todos os que têm pensado, ao longo do tempo, que a falta de coesão territorial é uma das debilidades do país e que o reforço da competitividade de Portugal necessita de políticas que diminuam as desigualdades territoriais.
Na verdade, nos últimos dez anos as preocupações com a coesão territorial desapareceram das políticas públicas e a dinâmica dos territórios do interior sofreu uma notória recessão. Os territórios de baixa densidade foram abandonados ao seu destino e o desenvolvimento das cidades médias perdeu velocidade e as suas lideranças perderam visibilidade e influência.
Desta vez o programa do governo dedica um subcapítulo inteiro à “coesão territorial” e refere, entre outros aspetos:
- Incorporar o desígnio de coesão territorial, de forma transversal, nas diversas políticas públicas setoriais…
- Conferir prioridade aos territórios mais vulneráveis… potenciando parcerias urbano/rural que estabeleçam complementaridades e sinergias entre os territórios…
- Apostar no potencial competitivo dos territórios de baixa densidade, para acolher investimento empresarial inovador e competitivo…
- Reforçar o diferencial de incentivos para investimentos direcionados para as regiões de baixa densidade…
- Promover a contratação de trabalhadores qualificados, em especial jovens, no interior;
- Valorizar o papel dos institutos politécnicos…
- Promover a qualificação e a valorização dos recursos endógenos…
- Criar incentivos ao investimento nas áreas territoriais fronteiriças;
- Criar programas de mobilidade transfronteiriça para estudantes;
- Garantir serviços e estruturas adequados aos contextos socioterritoriais de baixa densidade…
Estas são dez das várias dezenas de medidas enunciadas no programa de governo no respeitante à coesão territorial e que elevam muito as expetativas sobre a futura governação.
Mas, convirá dizer que quanto mais altas as expetativas maiores as satisfações ou… as frustrações. E no governo passado foi o que se viu, ou melhor, o que não se viu. Será que agora vamos ver finalmente uma política articulada e consistente de coesão territorial e desenvolvimento do interior?