Valter Lemos
RANKINGS ESCOLARES: O POPULISMO JORNALÍSTICO-EDUCATIVO
A maioria dos governantes e políticos na área da educação têm-se pronunciado de forma desfavorável relativamente aos rankings escolares. Dos responsáveis políticos que passaram pelo Ministério da Educação creio mesmo que só Nuno Crato não o terá feito de forma inequívoca. Também no meio académico tais rankings têm sido amplamente criticados, quer na forma como são calculados, quer na sua apresentação, quer nos seus efeitos.
Podem citar-se centenas de artigos que mostram não só a insuficiência dos rankings (face ao que os próprios promotores dizem ser a sua finalidade), mas também, as distorções da realidade que pretendem retratar, os efeitos negativos na dinâmica das escolas que atendem as populações mais pobres e com mais baixo capital social e cultural, além da perpetuação da grande mentira da medição do efeito de escola somente através de exames (e de determinadas disciplinas). Estamos perante o mesmo embuste dos testes de inteligência de Binet, que quando questionado sobre o que era, afinal, a inteligência que ele andava a testar, terá respondido: “Bom, a inteligência é… aquilo que os meus testes medem!”.
Do ponto de vista da apreciação organizacional e política, creio que o recente artigo no Público de João Costa, atual Secretário de Estado Adjunto da Educação, é uma boa síntese do que tem sido dito por diversos dos seus antecessores e outros responsáveis sobre os rankings:
“Já não vale muito a pena repisar a sua inutilidade. Não mostram a qualidade das ofertas educativas, refletindo mais o contexto do que o mérito. Não mostram o trabalho efetivo das escolas em que lutar contra o abandono e a exclusão é um trabalho muito mais árduo e frutífero do que a conquista da centésima no exame, resumida à verificação de que a explicação extraescolar funcionou. Não revelam que os alunos migrantes aprenderam o alfabeto romano e hoje falam português e chegam longe numa corrida desigual. Uma lista seriada em que se fazem reportagens com o top 20 sem se comentar a variabilidade aleatória do meio da tabela… Estas listas não honram o trabalho feito nas escolas.”
Mas, apesar das continuadas tomadas de posição de políticos e cientistas, televisões e jornais enchem todos os anos horas de emissão e dezenas de páginas digitais e de papel numa operação de larga escala de divulgação dos famigerados rankings. Nesta operação unem-se Expresso e Correio da Manhã, SIC, TVI e RTP, Observador e Público, etc., etc., com títulos como “As trinta melhores escolas do país são privadas”.
Repare-se que não são já sequer as trinta escolas mais bem colocadas no ranking, ou as trinta com melhores resultados nos exames - são as “trinta melhores escolas”.
Porquê?
Se perguntarmos aos responsáveis dos órgãos de informação dirão naturalmente que é porque é notícia. A mesma nebulosa razão (para quem não é jornalista) de toda a publicação de notícias, desde violações, assassinatos, covid 19, comícios do Trump, alterações climáticas…
Mas, suspeito que deve haver algo mais. Afinal somando as peças de todo o ano sobre todos os assuntos possíveis relativos às escolas, estes jornais e televisões ocupam menos tempo e espaço, no total, do que ocupam só com este assunto.
É lícito, pois, perguntar porquê?
Alguns atores políticos dizem que se as escolas mais bem colocadas no ranking fossem públicas, o “tal critério jornalístico” mudaria, o que não podemos assegurar que seja verdadeiro, mas “se no é vero é ben trovato”. Não deixa de ser um bom exercício intelectual e jornalístico, o equacionamento do comportamento previsível daqueles órgãos de comunicação se as “trinta melhores” fossem repetidamente escolas públicas do Alentejo, Beira ou Trás-os-Montes, em vez de serem colégios privados da Grande Lisboa e do Grande Porto, frequentados pelos filhos dos altos quadros empresariais, financeiros, políticos, etc.
Mas a pista do dinheiro é sempre uma das melhores de seguir quando estão em causa interesses específicos. Talvez fosse interessante saber quais são as receitas de publicidade desses órgãos de comunicação social, associadas a este dossier e já nem digo as fontes dessas receitas…
Talvez esta visão seja excessivamente conspirativa e injusta para as televisões e jornais envolvidos, mas ver, por exemplo, Expresso e Correio da Manhã, tão irmãmente empenhados na mesma causa noticiosa, não pode deixar de nos levar a pensar…
E a verdade é que não estão a prestar um bom serviço à educação, aos professores e aos alunos e também aos pais e à comunidade. Mesmo que se justifiquem e repitam constantemente que os professores, a maioria dos cientistas e também, neste caso, a maioria dos políticos é que estão errados.