João Carlos Antunes
Apontamentos da Semana...
POR ESTES DIAS, ANTÓNIO GUTERRES no seu papel de presidente da Organização das Nações Unidas alertou o mundo, em particular os países mais ricos para o problema da desigualdade no acesso à vacinação. No fundo, esta desigualdade não é nenhuma surpresa, já que as relações entre países pobres e países ricos reproduzem as diferenças de classe dentro de cada sociedade organizada. Não era de esperar coisa diferente, mas desejava-se no mínimo que uma política internacional solidária, junto com o filantropismo de nomes como Bill Gates, fizesse diluir de alguma forma estas desigualdades de acesso a um bem que faz a diferença entre a vida e a morte. Mas os números de que falou António Guterres são de tal forma escandalosos que obrigará necessariamente a refletir sobre esta crise pandémica que já matou perto de dois milhões e meio de pessoas em todo o mundo e que estará longe de estar resolvida se não forem criadas as condições para que a vacina chegue rapidamente a todos, sejam ele países pobres, remediados ou ricos. E o que ele lembrou foi que até hoje, mais de dois terços das vacinas serviram para vacinar a população de dez países, enquanto há cento e trinta países que não receberam qualquer dose. De uma forma bem assertiva o presidente da ONU lembra que o acesso às vacinas é uma questão de direitos humanos, um bem de acesso público, acessível a todos. É uma situação que tem de nos preocupar a todos por duas ordens de razão. Pelo egoísmo que revela e já constatado por todos, na corrida desenfreada à aquisição e quase açambarcamento das vacinas. E porque todos os especialistas alertam para o facto de que se deixarmos o vírus à solta nos países mais pobres, vão aparecer certamente mutações, provavelmente algumas resistentes às vacinas entretanto desenvolvidas em tempo recorde por um exército de cientistas. Com a certeza de que se isso acontecer, vivendo-se num mundo global, não será de todo garantido que nos iremos libertar tão depressa deste pesadelo que afeta tanto a saúde física e mental como a saúde da economia.
PARA TRATAR DA SAÚDE DA ECONOMIA saída desta guerra, já temos as vitaminas e já se conhece a prescrição. Que está vertida no papel sob a forma de Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) agora apresentado pelo governo para discussão pública até ao final do mês. Será uma vitamina (a imagem da bazuca já ficou para trás) de 16.643 milhões, dos quais quase 14 milhões será em forma de subvenções, ou seja, a fundo perdido, que serão injetados numa economia suportada por um tecido empresarial que vai sair completamente exaurido desta crise que nunca ninguém tinha vivido igual. Por tudo isso é importante que a oposição e sociedade civil tenham uma palavra a dizer sobre o plano que, se equilibrado e bem aplicado, não deverá deixar setores esquecidos, como muito bem o lembraram os agentes da cultura e pode ser o ponto de partida para um período de prosperidade e desenvolvimento que todos nós merecemos.