Edição nº 1679 - 24 de fevereiro de 2021

Elsa Ligeiro
VEMOS, OUVIMOS E LEMOS – NÃO PODEMOS IGNORAR

Vemos, ouvimos e lemos é um verso político de Sophia de Mello Breyner Andresen, escrito para uma vigília na Capela do Rato, em Lisboa, contra a guerra colonial e a favor da liberdade; e que Francisco Fanhais musicou e cantou em 1970 para dar Voz à revolta e apelar à dignidade humana.
A “Cantada da Paz” está ainda na memória de muitos, mas temo que seja uma novidade para muitos outros, apesar de continuar disponível em poema ou em canção para os que a desejarem ouvir ou Ler no seu computador.
“Vemos Ouvimos e Lemos - não podemos ignorar” é o refrão da Cantata política que hoje devemos revisitar neste “estado de emergência” contínuo, que é, apesar de tudo, um estado para o reforço do trabalho e do empenhamento.
Um trabalho acrescido, melhorado e com mais responsabilidade social.
Por isso, causa-me uma certa tristeza que um gabinete de comunicação de uma autarquia anuncie, como se de uma informação importante se tratasse, o cancelamento do Carnaval, quando a data nunca foi uma tradição local.
As escolas excecionalmente fechadas, com os alunos e professores em casa devido à gravidade da situação, e aparece um comunicado de uma instituição pública a dar conta de que, lamentavelmente, o Carnaval não se pode realizar é, na minha opinião, uma notícia escusada. Uma perda de tempo.
Mas infelizmente não é única, com alguma surpresa vejo algumas instituições públicas, que, um ano após a catástrofe se ter instalado; ainda não encontraram forma de estar, apoiar e comunicar com os seus munícipes.
A sua comunicação e os seus contratos publicitários milionários, especialmente nesta fase, denotam uma falta de integridade e consciência do estado em que vivemos todos; e são a prova de que vivem ainda numa redoma de vidro, protegidos pelo erário público; e a que ainda não lhes faltou nenhum bem essencial.
O que lhes falta é bom senso, trabalho, e a consciência que há pessoas a passar dificuldades extremas.
José Gil publicou recentemente um ensaio no jornal “Público” sobre “A Democracia e os Mortos”, de enorme importância para entender a pandemia e o estado de emergência que nos cabe a todos viver em 2021, onde o filósofo escreve: “Perante a efemeridade da vida, agora intensa e imediatamente sentida, cada existência adquire um valor infinito” e, ainda segundo ele, nunca foram tão importantes e tão sentidos dois princípios: “Igualdade e Singularidade”, que são os valores onde assenta o espírito da democracia.
Respeitar cada pessoa com a singularidade do que é o que faz, numa igualdade à hora de resolver os problemas comuns, parece-me uma regra simples para ser assimilada por quem foi eleito para nos representar, mas acima de tudo para executar os princípios fundamentais que, felizmente, a Constituição da República Portuguesa contém de forma clara e inequívoca.
Apesar de as livrarias continuarem fechadas; os livros não poderem ser requisitados ou recolhidos numa Biblioteca, vemos, ouvimos e lemos; e pela paz e pela democracia; não podemos ignorar as desigualdades na distribuição de rendimentos.
Não podemos ignorar uma burocracia estatal e autárquica que tudo controla à hora de recolher e muito esquece à hora de distribuir.
Apesar de a televisão ser (cada vez mais) uma montra para espetáculos de decadência cívica e cultural, nós, os ainda leitores, reafirmamos: Vemos, ouvimos e lemos, não podemos ignorar.

24/02/2021
 

Outros Artigos

Em Agenda

 
29/05 a 12/10
Castanheira Retrospetiva Centro de Cultura Contemporânea de Castelo Branco

Gala Troféu Gazeta Atletismo 2023

Castelo Branco nos Açores

Video