Edição nº 1711 - 13 de outubro de 2021

José Dias Pires
EM DEMOCRACIA, PENSAR DIFERENTE NÃO IMPLICA PENSAR MAL

A culpa nunca é das palavras, mas de quem delas se serve para as mal usar.
Nada mais apropriado para introduzir esta reflexão que relembrar Voltaire, o escritor e filósofo francês a quem se atribui a seguinte frase: «Não concordo com o que tu dizes, mas defenderei até a morte o teu direito em dizê-lo.»
Na verdade, pensar diferente não é pecado e muito menos será crime (embora a História nos lembre que houve quem pensasse o contrário). Pensar diferente é um direito e privilégio de qualquer pessoa que implica respeito por quem, de forma livre, o manifesta. No artigo 19º, da Declaração Universal dos Direitos Humanos está escrito que «Todos os seres humanos têm direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras».
Cresci a aprender que nem tudo o que penso é apreciado por outras pessoas e a afirmar que nem tudo o que algumas pessoas fazem ou dizem é do meu agrado. Obrigo-me a expressar as minhas opiniões com respeito (sejam ou não compartilhadas) e a privilegiar o contraditório.
Não duvido que o raciocínio e o debate nos possibilita conhecer pessoas que pensam diferente, e que, apesar disso, enriquecem a nossa forma de ver as coisas e de tomar decisões.
Afinal, ser diferente não é pensar igual. Pensar de forma diversa e não compartilhar opiniões de outros implica tudo menos rejeição ou ostracismo.
No país a que pertencemos e no lugar onde vivemos, ser diferente tem tudo a ver com o ser generoso ou egoísta; o ser solidário ou não; o ser tolerante ou intolerante.
Habituei-me a pensar sem medo que me chamem aprendiz de utopia. Por isso acredito no diferente e na diferença que pretende agir para mudar e de fazer para resolver de forma compreensiva e fundamentada.
Aceitar a diferença (e compreendê-la) é um exercício democrático, um aceitar a liberdade de expressão como a fórmula que contraria os sectarismos e os dogmatismos, uma democracia integradora capaz de estar sempre a reinventar-se e sempre sem medo das palavras.
Querem ver?
«Tem a palavra a palavra Palavra», disse eu. «Palavra?», perguntou a palavra. «Palavra, Palavra!», completei. «Então, se me dás a palavra, tomo a palavra», disse a palavra que falou assim: «Tem a palavra Palavra muito que palavrear, num falar apalavrado que não é da família do paleio apalermado, embora eu tenha receio que por vezes o pareça. Mas, para que não se esqueça que este discurso começa na palavra que me foi dada, retomo, numa palavra, a palavra dada. Aí, no palco onde a palavra lavra, a larva da palavra, que não é parva, tem sempre uma palavra doce na ponta da palavra.» «Então és palavrosa!», perguntei. «Isso era se eu fosse vaidosa!», respondeu. «Então és parlapativa!», insisti. «Isso era se eu fosse complicativa, mas nem uma ou outra isto é.» «Então é só parlapié?» «Não, nada disso. Eu, a palavra, sou um feitiço que começa na cabeça, e escorrega na garganta até cair no coração. Depois, subo corpo acima, de mansinho, ou de rompante, e, num instante, fico brisa ou furacão, e vou, sorrateira, a medo, espreitar no canto da boca, num gesto feito pela mão, ou na ponta da caneta para ser lida pelos ouvidos, ou ouvida com os olhos!» «És marota quando falas!» «Sim, sou… engraçada! Estou aqui e, não tarda, estou aí! Afinal não custa nada à palavra Palavra ter a palavra, pois não sou daquelas que andam cheias de medo de si!» «Palavra?» «Palavra! Queres ver?» «E onde me vais levar?» «Dentro de um livro! Haverá melhor lugar para estar presa e ser livre?!», disse a palavra Palavra»

13/10/2021
 

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