Edição nº 1712 - 20 de outubro de 2021

Lopes Marcelo
O HOMEM QUE PLANTAVA ÁRVORES

Vivemos um tempo de agitação e de conflitos por tudo e por nada. A comunicação social, em permanentes sobressaltos, amplifica sobretudo o que é mais dramático e negativo. Em contra corrente, assumo referir hoje um testemunho de heroísmo anónimo e singular. Constitui bandeira de exemplo sublime a vida de um homem simples, analfabeto de letras mas sensível e generoso conhecedor da natureza. Apenas com os seus recursos morais e físicos, com as suas próprias mãos, grande força de vontade e esperança no futuro, foi capaz de fazer surgir uma floresta num terreno árido, quase sem vegetação. Não se trata de romance de ficção, de história de filme ou de ouvir contar. Aconteceu não muito longe daqui, nas fraldas dos Alpes franceses, na Provença, área de Vergons. O homem teve nome, Elzéard Bouffier e a sua dedicada acção decorreu na primeira metade do século passado.
As aldeias da região, espalhadas pelas encostas da montanha revestida por matagal de carvalhal, eram habitadas por poucas famílias de carvoeiros com fracas condições de vida. A água escasseava, as nascentes e poços secavam e a vida era cada vez mais difícil levando ao abandono das aldeias. Neste contexto, o Sr. Bouffier que era agricultor, na sequência de ter perdido o filho e enviuvado, resolveu deixar a aldeia e partir para a montanha de modo a viver em paz com um pequeno rebanho de ovelhas de que tirava o seu sustento. Recuperou um abrigo em ruínas para a sua modesta habitação e, enquanto apascentava as suas ovelhas, começou a recolher bolotas, a seleccioná-las. Como cajado, usava uma barra de ferro com o qual perfurava o solo e enterrava as bolotas. Muitas não nasciam, mas ele cada dia se dedicava mais à tarefa que tinha assumido de colaborar com a natureza, já que no seu entender a terra estava a morrer por falta de árvores. Assim, não tendo problemas urgentes para resolver decidira solucionar aquele estado de coisas, sem se preocupar em saber de quem era a terra. De facto, por aquelas inóspitas paragens não aparecia vivalma e, provavelmente, seriam terrenos baldios. Embora poucas árvores vingassem, o nosso pastor não desistia de as plantar. Dedicava-se a recolher as bolotas, a seleccioná-las por espécies e a armazená-las de modo a que pudesse realizar o seu plano de todos os dias enterrar uma centena.
A cada ano que passava, iam vingando mais árvores que por vezes eram destruídas pelo seu rebanho. Logo o nosso semeador de bolotas reduziu o seu rebanho ao mínimo da sua subsistência e passou a tratar de colmeias, já que na jovem floresta cada vez mais diversificada, reapareceram insectos e outros pequenos animais. As zonas com humidade foram aumentando.
Ao fim de dez anos a mancha de floresta de carvalhos, faias e bétulas era já muito grande e bastante densa. Os dias de neblina foram aumentando e até a chuva surgia com mais frequência.
Na paz da sua solidão, o nosso homem dedicava-se ao que considerava o seu trabalho, dialogando e aprendendo com a natureza. A criação parecia surgir através de uma reacção em cadeia. Ele não se preocupava, encarava e prosseguia com estoicismo aquela tarefa com a sua simplicidade e dedicação generosa. Passaram anos e anos, mais de três décadas e nos riachos secos começou a correr alguma água. O vento espalhara as sementes. Com o aumento das árvores, surgiram os salgueiros, os juncos, os prados e as flores. A transformação ocorreu tão lentamente, que não causou espanto. Os caçadores e quem cruzava a região tinham reparado no surgimento das árvores e das espécies animais mas atribuíram-nos ao capricho da natureza. Por isso é que ninguém interferiu com o trabalho de Elzéard Bouffier.
À volta das aldeias, no lugar das ruínas, foi surgindo o renascer da vida. As fontes, os velhos ribeiros, alimentados pela neve e pela chuva que vinha da montanha, voltaram a correr. Pouco a pouco, as aldeias repovoaram-se e foram reconstruídas. Mais de dez mil pessoas passaram a viver mais confortavelmente e devem a felicidade ao exemplo de vida de Elzéard Bouffier.
Nota: A narrativa desta extraordinária história real consta do livro “O HOMEM QUE PLANTAVA ÁRVORES” da autoria de Jean Giono; Cultura Editora.

20/10/2021
 

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