João Carlos Antunes
Apontamentos da Semana...
FIZERAM CEM DIAS que se iniciou a agressão destruidora da Rússia à Ucrânia. Cem dias que ultrapassaram por muito a 72 horas que Putin achava suficientes para conquistar a Ucrânia e colocar em Kiev um governo fantoche na linha do que colocou na Bielorrússia. São cem dias que se adivinha, se irão estender por vários meses ainda. O que vai ser dramático para a Europa, para o Mundo em geral, em particular para as populações dos países mais pobres. O cinismo desenvergonhado de Putin aponta a culpa pela escassez do trigo no Mundo, com muitos milhares de toneladas retidas na Ucrânia, ao país invadido e aos que o apoiam nos esforços militares. Uma guerra longa e os efeitos nos preços dos combustíveis e na inflação, vai provavelmente provocar desgaste nos sentimentos de solidariedade de parte importante de população. Ainda segunda-feira, a propósito do tremendo aumento dos combustíveis, um popular questionava sobre a razão porque ele teria que pagar pelos problemas dos outros. E nessa onda, o PCP já pede o fim das sanções. E há quem defenda, como o presidente Macron, que numas futuras negociações de paz não se deve humilhar Putin. Não se deve humilhar o homem que mostra uma frieza indescritível na dor e destruição que promove? Não se deve humilhar um homem que está a provocar uma crise económica como jamais se sonharia? Que chantageia o Mundo com a insegurança alimentar? O líder de uma nação militarmente poderosa que está com manifesta dificuldade em atingir os objetivos de conquista. Aliás, neste momento já nem se conhecem verdadeiramente os objetivos da operação especial, o que tornará ainda mais difícil o sucesso das negociações para a paz.
PERIODICAMENTE CAVACO SILVA, ou através da publicação de livros ou de artigos de opinião, vai dando provas de vida que animam a nossa vida política e entusiasmam os sobreviventes do cavaquismo. Desta vez, publica no jornal eletrónico Observador um artigo onde, quatro meses depois das eleições vem saudar António Costa pela conquista da maioria absoluta. É um texto de resposta ao discurso de Costa, na tomada de posse do novo governo, que afirmou esta maioria absoluta não ser igual a outras onde teria havido falta de diálogo. Cavaco não gostou, considerando que a alusão lhe era dirigida e vai de desafiar o atual primeiro ministro a fazer mais e melhor que ele. Um texto onde enumera os seus sucessos no diálogo que conduziram a reformas importantes e atribui a António Costa qualidades de reformista e habilidoso que, surpreendentemente irónico, fará com que esta maioria absoluta tenha uma governação melhor do que a de Cavaco Silva. E voltou à acusação já várias vezes repetida de que este é um governo de bullying, com asfixia da democracia e de que, para os socialistas, o Estado é deles. Acima de tudo, mesmo não se reconhecendo na herança política de Cavaco Silva, é evidente que temos de reconhecer ao antigo político, que se diz retirado, o direito a manifestar a sua opinião. Sem bullying e no pleno direito de uma democracia livre. Com defeitos, mas com imprensa livre.