João Carlos Antunes
Apontamentos da Semana...
Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!
É com o poema de Florbela Espanca, musicado pelos Trovante, e no Dia em que o Mundo celebra a Poesia, que escrevo as primeiras palavras deste apontamento da Gazeta do Interior que esta semana tem poesia na primeira página e com respigos noutras páginas. Nos tempos mais conturbados, a poesia tem ainda mais força. Não será por acaso que o primeiro livro de poesia que julgo ter comprado, anos 70, estudante universitário politizado, foi Pátria, Lugar de Exílio, de Daniel Filipe.
E no entanto é doce dizer pátria
sonhar a terra livre e insubmissa
inteiramente nossa
Sonhá-la como se pedra a pedra a construíssemos (...)
O livro de poesia é o refúgio seguro, nos dias em que as notícias e imagens que enchem a comunicação social, parecem um conto de terror de um mundo distópico. O livro de poesia é liberdade. De ler pelo princípio ou pelo fim, a liberdade de saltar páginas, folhear e parar naquele poema que nos toca. À maneira de Camões, nade-se até à margem das malfeitorias do Mundo com o livro de poesia por cima das águas.
Não sei se a poesia tem leitores, leia-se páginas adiante o que os editores de poesia dizem sobre o assunto. Como frequentador de livrarias, a perceção que tenho é de que o espaço dedicados à poesia tem crescido e que há autores como David Mourão-Ferreira, Nuno Júdice, Maria Teresa Horta ou Alexandre O’Neil têm cada vez mais leitores e esgotam edições. Porque só os queremos depois de mortos?
Todos os países têm o seu poeta: Walt Whitman, Drummond de Andrade, Neruda, Baudelaire, Garcia Lorca, Shakespeare. E Camões tão nosso que até tem direito a dia feriado, Dia de Camões, de Portugal e das Comunidades. Somos País de poetas, na nossa Beira, somos território de poetas, de muitos e bons poetas. As razões de ser território inspirador alguém as aponte. Temos João Roiz de Castelo Branco, temos António Salvado, Eugénio de Andrade, Manuel António Pina. Felizmente, temos muitos poetas vivos e publicados, de escrita plural, e até o privilégio de termos um autarca poeta (ou poeta autarca?): José Dias Pires, José Guardado Moreira, João de Sousa Teixeira, João Camilo, António Fontinhas, Gonçalo Salvado… E há outros que nunca foram publicados. Como o Carlos Barata, que morreu novo não há muito tempo, discreto e habitual frequentador dos eventos culturais que aqui acontecem, poeta prolífico mas nunca publicado. Por isso, em sua homenagem e em representação dos poetas beirões não publicados, é com um poema do Carlos que fecho este apontamento
Que é de mim
Se me não vejo passar
Na montra da Avenida
Que faço? Que caminho?
Que passo de dança, que desalinho!