Edição nº 1924 - 10 de dezembro de 2025

Antonieta Garcia
ERA UMA VEZ...

Ontem, voaram, desajeitados, para as minhas mãos livros provocadores. Tudo começou com uma ligeira investida nas estantes. Estavam muito arrumadinhos, ordenados, mas bastou um puxão maior para, anarquicamente, se abrirem a meio, uns perfeitos, outros desmanchados q.b. Irritada, fui espreitando e despertando para leituras, levantando uns, lendo umas linhas de outros... Contas feitas, somaram-se horas... Logo continuo com esta tarefa.
-Ó professora hoje vens tão bonita!
E haverá maior afeto do que o desta aluna? Respondo? Calo e passo à frente? Com os olhitos em cima das mesas, intrometi-me:
- Tu vens sempre bonita. Tu e os teus amigos e amigas trazem para esta sala de aula um bocadinho de Céu, de Paraíso... Damos as boas-vindas atirando cinco beijinhos, uns aos outros? Todos! - Força! Um... Dois... Três... Quatro... Cinco... Palmas!
Acredite-se ou não, a sala de aula do primeiro ano ficou mais luminosa e meiga. Pertinho do Natal tudo é possível.
Vamos festejar o nascimento do Menino. Ainda não veio. Tem de ser uma Festa maior.
Ora bem, quem sabe os nomes das figuras: - São José, o Pai; Nossa Senhora, a Mãe; e Jesus, o Filho... Conto três, ou seja, o Pai, a Mãe e o Filho.
Percebi que o Alberto, de mãos abertas e dedos esticados, fazia outras contas... Contestou:
- Professora não são três figuras; são quatro...
Abre-se outra voz:
- Pois, professora, o São José não é Pai; é padrasto... A minha mãe sabe; contou-me...
Ouviram-se protestos. E agora? Arrisquei:
- E a tua mãe aceitaria contar-nos a história que sabe sobre este Menino?
Todos ajudaram. Os relatos iniciaram-se, com muitas histórias conhecidas, inventadas... As narrativas começavam: - Era uma vez... ou, Naquele tempo... ou, Há muitos, muitos anos...Ou...
Apareceram estórias ditas numa linguagem cheia de colorido... De forma velada ou às claras, as manhas do pastor, a inteligência dos desfavorecidos perante o poder, merecem louvores. Por exemplo, a enorme variedade de contos em que a raposa é protagonista e vence o lobo (detentor da força), surpreendem; são o engenho e a astúcia que lhes permite que saiam vitoriosos de muitos apuros: “Um conto aldeão é uma lição de autodefesa contra todas as opressões.”
Estas narrativas contam a vida, a muita fome e os mil e um estratagemas para conseguir comer, a desconfiança face à justiça... aliam-se frequentemente à sátira que atinge toda a galeria social.
E como o exemplo vem do alto, ouça-se a história real de um camponês que pretendia ampliar fraudulentamente a sua propriedade. Ao argumento de “uma questão de consciência”, usado pelo advogado para recusar o propósito, responde o labrego, mas finório: Senhor Doutor: a consciência é uma couve. Veio um burro e comeu-a… E ria-se, alarve…
Razões que nos interrogam, quando lemos e cantamos com os poetas: “O pau da vide chora.”
Chora a videira / Chora o limão / Chora a videirinha / Não chora, não /. (...) Vós dizeis aparta, aparta / O vinho tinto do branco / (...) Também a mim me apartaram / De quem eu gostava tanto! / Chora a videira...
A música da madeira a arder ouvida em casa, perto da lareira, na quinta... perturbam Quem chora assim, perto de nós?
Possuído por palavras, o poeta que não perdeu o menino que tem dentro de si, pode relacionar-se de forma sempre nova com a linguagem. As palavras salvam.
Partilho a voz de Eugénio de Andrade: “Quanto a mim, gosto das palavras que sabem a terra, a água, aos frutos do fogo do verão, aos barcos no vento; gosto das palavras lisas como seixos, rugosas como pão de centeio. Palavras que cheiram a feno e a poeira, a barro e a limão, a resina e a sol...”

10/12/2025
 

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