14 Agosto 2013

Antonieta Garcia
As pessoas de quem gostamos não têm idade

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Aqui há tempos, um rapaz novo, que tenho o prazer de não conhecer, responsabilizava a “peste grisalha” pelos males maiores do país.
Não era uma teoria pessoal, mas o moço encontrou uma fórmula que lhe trouxe o seu momento de glória retórica par(a)lamentar. Outros se seguirão, por certo, esperemos que mais refletidos e menos cruéis.
Na verdade, era desejável que todos os que quisessem chegassem a velhos. Quem gosta de viver, gosta das pessoas e se sente bem pode, na velhice, fruir momentos que justificam o louvar dos dias, a cada nova manhã. A saúde não é o que era, o corpo desgasta-se; perdem-se crenças, ganham-se outras. Avós embevecidos com os netos, pais atentos aos filhos, já choraram perdas de familiares, de amigos… Tratam por tu a tristeza, festejam a alegria. Desculpem lá: enquanto há vida, que se viva!
Pois é, a expressão “peste grisalha” perturbou. Devia ser esse o objetivo do moço. Pensando bem, a peste é um mal que contamina, dizima populações. Por que razão odeia este rapaz os idosos? Há de ter avós, pais, tios…
Por certo, não pensou neles, quando proferiu a frase infame. As pessoas de quem gostamos não têm idade. A maioria dos miúdos constrói lembranças afetivas de momentos de infância que os avós protagonizaram e que acrescentam sorrisos e bem-estar à vida. Guardamo-los arrecadadinhos na memória e são miminhos que ninguém nos tira. Não será, infelizmente, o caso do pobre rapaz. Que pena!
Acresce que o equilíbrio da sociedade se faz com gente de todas as idades, com uma boa distribuição de alegria e prazer e de soluços e aflições, independentemente da faixa etária de cada indivíduo.
E recuso qualquer ideia do velhinho coitadinho. Nem admito que tenham dó. Afinal há gente que nunca foi nova e há pessoas que nunca envelhecem. Só é pena que incomodem, alguns, os anos de vida que a outros calham. Erros deles. Acreditai: há tiranos de intenção. Se pudessem, apagavam do mundo os velhos. Ficam caros, adoecem, e morrem muito tarde…
Não era, porém, a frase tristemente célebre do parlamentar que motivaria este texto. Mas a programação governamental para uma anunciada “purificação social”, pagamento de dívidas, indigna quem quer que seja! Retirar as pensões ao vulgo, com impostos e taxas de solidariedade é prática aceitável? Imagine-se que nas de sobrevivência, tudo o que supere os 300 euros, é demais. Trata-se de subsistir e qualquer esmola serve? Simultaneamente dificulta-se o acesso aos serviços de saúde, aumenta-se o IVA…
Ora, ouvimos o Presidente da República apiedar-se, publicamente, do montante que a esposa recebia de reforma – 800 euros mensais-. Esperamos, pois, que manifeste idênticas preocupações com os que vencem verbas bem menores, e têm de comer, pagar água, luz, medicamentos…
Recordamos que há reformas chorudas, conquistadas porque a lei o permite. Mas são imorais, em situação de crise, quando se pedem sacrifícios a quem nunca deixou de os fazer.
Aprendi, em menina e moça, que o Estado era pessoa de bem. Era. Porque se as reformas gordas são legítimas, também os descontos efetuados pelos funcionários, para usufruir da reforma, foram os exigidos por lei. Direito adquirido, pois, deixou de o ser e os cortes mais vergonhosos de que há memória, aí estão. Com pouca voz para virem para a rua, sem a arma da greve, tudo podem fazer aos idosos. Será a história que julgará um conjunto de homens que, por um lado, permitiu a acumulação de pensões milionárias e, por outro, retirou o pouco a quem está desprovido de tudo.
Velho é para morrer? Fazem o pão caro? Desapareçam? Fosse o tempo da maria-da-fonte e certos cabrais falsos à nação não ousariam destruir a réstia de dias que sobram de vida. Sem rumo, com pouca sorte e sem norte, o país vagueia ao deus-dará! Maquiaveis, meio pífios, baralham o discurso, não se deixam entender. Dentro e fora do convento, a confiança está de folga. Por dá cá aquela palha, estala a discórdia e até pedem demissão…Hoje vale, amanhã não, e tudo muda num ai. Cada qual escolhe a versão do um, dois, três… já não vale! Isto é um deus-nos-acuda!
O povo anda descrente, cansado de noviços! Clamam, gritam e legislam noite dentro, ensonados… Escolhem ministros, secretários que não duram nem um mês. Sem experiência, remodelam, e fica tudo na mesma. Que fazer com tal governo?
Caiu-lhes a crise em cima. O orçamento estreita, tudo grita, estrebucha, há que fazer sacrifícios, e os pensionistas, idosos, estão a jeito. Que pague excessos de outros, o povo que é sereno. O Zé paga e aguenta que é o fado que aprendeu.
Apregoam: Não fossem os europeus, parceiros de alto coturno, pacientes e bondosos a aturar esta cegueira, gente sem eira, nem beira, passava fome de rato. Os idosos são frugais; se não são, passam a ser. Uma fatia da pensão não dói nada. A dona austeridade é uma oportunidade.
Oremos, nós, bons irmãos, em coro, com muita fé: Perdoai, Senhor, os nossos governantes porque, como dizia Sophia de Mello Breyner, eles sabem o que fazem.

14/08/2013
 

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