Lopes Marcelo
Viva a poesia
Homem das palavras, o poeta é essencialmente homem de palavra! Procura e assume as palavras que deixa escorrer pelas mãos na sua solidão criativa, qual fonte onde podemos beber a íntima e silenciosa música do despertar...
O trabalho do poeta é fazer nascer as palavras do silêncio. Ter o silêncio como a tela do seu paciente trabalho, na melódica oficina de tentar acrescentar o dizível, de almejar roçar o absoluto e de revisitar o sublime, dando-se em palavras e pelas suas palavras partilhando a espuma criativa dos seus dias...
Pela escrita se pode morrer um pouco todos os dias, para se renascer em renovada germinação na pauta da ternura, a tornar fecundo o arco íntimo dos afectos. Sendo justo que uma pauta de afecto sempre tenha rodeado o poeta António Salvado, associo-me à onda de afectuosa celebração do homem e da sua extensa obra que nos vai fazer vibrar nos próximos dias de festa e de merecida homenagem. A sua dedicação, a sua maneira de estar na vida, a procura e a partilha de renovadas imagens, sonhos e emoções pelos seus livros, sublinho a minha gratidão através de um pequeno poema que é uma interpretação do que é ser poeta.
O poeta é, simplesmente,
alguém entre gente
que vive a seu geito
abrigando uma ave no peito.
Ave, palavra sonhadora,
livre pensadora
que só voando acalma
a sede da alma.
Ave, palavra que canta
e inventa a pauta da vida
chilreando como sente,
qual coração singelo de gente.
Ave, que lá do alto,
prepara o silencioso salto,
a mergulhar fundo
no murmúrio das fontes!
Bem-Haja Dr António Salvado pelo seu empenho e dedicação à aventura poética e intensa actividade de grande relevância cultural ao longo de toda a sua vida.