26 março 2014

Fernando Raposo
É Pois Hora de Decidir de que Lado está a Verdade

Passos reagira de forma precipitada e imprudente. Num assomo incontido de raiva, revelara a sua falta de maturidade democrática, característica tão comum a quem se julga senhor da verdade absoluta e “dono do mundo”.
Ao dirigir-se às personalidades que subscreveram o Manifesto dos 70, por “essa gente”, acusando-os de irrealistas e irresponsáveis, Passos revelou um vez mais que não está disponível para ouvir, nem para construir quaisquer consensos, seja com a oposição, com os parceiros sociais ou seja lá com quem for.
Por isso os inúmeros apelos ao consenso por parte do Senhor Presidente da República deixam de fazer qualquer sentido.
Entre “essa gente” estão personalidades que se situam num espectro político e social muito alargado, da esquerda à direita, do sector empresarial ao sindicalismo, do meio económico ao académico. Personalidades como Bagão Félix, Manuela Ferreira Leite, João Cravinho, Francisco Loução, António Saraiva, Carvalho da Silva, e tantas outras, que ao longo da vida procuraram e procuram fazer o seu melhor pelo país, devem merecer o nosso respeito e admiração.
Defender a reestruturação da dívida de “forma honrada e responsável” é antes de mais um acto de generosidade, de sentido patriótico e de oportunidade política.
Não se compreende, por isso, o embaraço do 1º Ministro, nem a vozearia dos opinantes acomodados do sistema estabelecido, quando no memorando se propõe, grosso modo, para aliviar o esforço dos portugueses, relançar a economia e assegurar o pagamento da dívida “uma redução das taxas de juro do stock da dívida, uma extensão das maturidades dos empréstimos para 40 ou mais anos e estudar soluções para reestruturar a dívida acima dos 60% do produto Interno bruto” (S. João Almeida e outros, Público de 13 de Março, p.4). Uma pretensão legítima e compreensível por parte de quem é devedor.
Com uma dívida pública a roçar os 130% do PIB e uma economia depauperada, em que os sinais de retoma são ainda muito incipientes, admitir que aquela é sustentável, sem que seja renegociada com os credores, é apenas a assunção de uma verdade fantasiosa e conveniente por parte daqueles que se renderam – sabe-se lá por que razões – aos ditames ideológicos de Passos, que com a realidade depressa se esfumará.
Apesar dos esforços, excessivos, que foram e continuam a ser exigidos à grande maioria dos portugueses, traduzidos no corte dos salários e das pensões, na elevada carga fiscal, entre outros e de terem sido alienadas as empresas do Estado, as mais cobiçadas pelos privados (EDP, REN, CTT, …), a dívida pública continua a crescer para níveis surpreendentes e insustentáveis.
No manifesto “Preparar a Reestruturação da Dívida Para Crescer Sustentadamente”, em boa hora apresentado, e que em meu entender deveria constituir leitura obrigatória para todos os portugueses, o diagnóstico é cristalino “No final de 2013 a dívida pública líquida era de 129% do PIB … O endividamento externo público e privado ascendeu a 225% do PIB”.
As consequências têm sido dramáticas.
A economia definhou, o desemprego atingiu níveis inimagináveis, “a reforma do Estado ficou por fazer, a classe média foi fustigada” e o fosso entre ricos e pobres acentuou-se de forma escandalosa.
De acordo com os últimos dados do Instituto nacional de Estatística, o risco de pobreza é agora o mais elevado dos últimos 60 anos. Um milhão de portugueses vive com menos de 275 euros.
Insensível ao sofrimento de muitos e muitos portugueses e indiferente aos inúmeros apelos, Passos insiste teimosamente em prosseguir o mesmo caminho que nos arrastou para este pesadelo, pelo que o contributo dos subscritores do memorando tem de ser visto como um gesto de patriotismo e como uma oportunidade de excelência, no contexto das eleições para o Parlamento Europeu.
Nunca como agora, os portugueses foram confrontados com duas propostas tão claras e tão distintas sobre o caminho que devemos seguir. Se o caminho que nos propõe Passos e que lhe é imposto pelos actuais lideres da Europa e de que Merkel é o rosto mais visível e cujas consequências têm sido demolidoras da dignidade e auto-estima dos portugueses ou se o caminho que nos é proposto pelas personalidades que subscreveram o memorando, para quem a resolução da crise só pode ser bem sucedida se se souber “conciliar a resposta à questão da dívida com a efectivação de um processo económico e de emprego num quadro de coesão e efectiva solidariedade nacional” (p.1).
Partilhando da opinião de que a reestruturação das dívidas, portuguesa e dos outros países do euro, como se refere no manifesto, “deverão ocorrer no espaço institucional europeu,” (p.3), uma vez que os países que aderiram ao euro não dispõem dos mecanismos que lhes permitam ganhar competitividade, designadamente política cambial, banco central, entre outros, julgo que esta é já matéria bastante que deve ser objecto de um amplo debate no âmbito da próxima campanha eleitoral e motivo suficiente para as nossas escolhas.
É pois hora de decidir de que lado está a verdade.

26/03/2014
 

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