Valter Lemos
CHEIRAR A MOFO E SALGAR A TERRA
Recentemente várias iniciativas de organizações de juventude foram notícia. A primeira respeita à Juventude Social-democrata (JSD) e ao referendo sobre a coadoção. Já é suficientemente estranho que sejam jovens a oporem-se à coadoção, a qual visa precisamente salvaguardar direitos de crianças e jovens que não escolheram as suas famílias e portanto é, naturalmente injusto, estarem menos protegidos do que todas as outras crianças e jovens. Mas a forma como a JSD (com a aprovação e imposição do PSD) provocou o adiamento, evitando a aprovação da lei e aprovando uma proposta de referendo, é uma batotice política que poderíamos esperar de políticos mais velhos formados na matreirice da politiquice, mas que não desejaríamos em jovens que são pretensamente os líderes do futuro. Ao mostrarem este estilo manhoso de estar na política, os jovens deputados da JSD, podem ter agradado aos seus chefes que funcionem na mesma escola política de manhosice, mas, desiludiram todos os cidadãos minimamente decentes e que não esperam dos jovens a “política da vermelhinha”, mas sim uma forma genuína e honesta de olhar. Mas, acresce que, na tentativa atabalhoada de justificar a proposta, o líder da JSD, veio dizer que “todos os direitos das pessoas podem ser referendados”, o que, aproxima a situação mais da indigência mental, senão da pura estupidez como no caso seguinte.
O segundo caso respeita, pois, à proposta da Juventude Centrista (JC) no congresso do CDS, no sentido de DIMINUIR a duração da escolaridade obrigatória. Pode haver várias formas de cumprir a escolaridade obrigatória, desde a frequência de um currículo único e comum, passando pela possibilidade dos jovens frequentarem cursos diversos mais académicos, mais vocacionais ou mais profissionalizantes ou até pela frequência escolar a tempo parcial, complementada com atividade laboral ou profissional. Mas que sentido faz a diminuição da sua duração, num mundo e numa sociedade cada vez mais complexa, onde, quer a vida profissional, quer mesmo a vida social, requerem cada vez mais conhecimento e competências diversificadas e onde a escola é o mais significativo instrumento de promoção da equidade face à inserção nessa sociedade? A proposta da JC cheira mesmo a mofo. Lembra os anos 40 em Portugal e o sinistro ministro Carneiro Pacheco, quando os deputados da nação diziam que “rapaz que fique distinto na instrução primária é rapaz perdido para a família”. Se a JC propusesse alternativas para o cumprimento da escolaridade obrigatória, poderia obter ou não concordância de outros parceiros ou observadores, mas, seria levada a sério. Assim, nem os seus correligionários do CDS quiseram sequer discutir a proposta. Há diferença entre o radicalismo e a estupidez e naturalmente, também no CDS, há gente que percebe isso.
SALGAR A TERRA
O Ministério da Educação continua a sua cruzada revolucionária de destruição e desmantelamento, não só das realizações do Governo Sócrates, mas também da maioria das políticas estruturantes da educação e da ciência dos diversos governos das últimas décadas. Após ter conseguido que, pela primeira vez na história, o Conselho de Reitores lhe anunciasse o corte de relações, o ministro levou o Conselho Coordenador do Ensino Superior Politécnico a pedir sua demissão após um ataque, profundamente preconceituoso, às Escolas Superiores de Educação com o único objetivo de degradar a imagem pública destas instituições, com base em falsidades absolutas, como se verificou. Mas, a tentativa de induzir a degradação dos politécnicos ainda tem outras dimensões, como a de querer impor às instituições cursos de dois anos sem qualquer grau ou sequer nível de qualificação, que nenhum jovem ou família, no seu juízo normal, escolherá, ficando os politécnicos sem alunos, o que justificaria o objetivo do seu encerramento.
A última ação revolucionária foi sobre a ciência. Pura e simplesmente o governo resolveu reduzir as bolsas de doutoramento e pós-doutoramento para o nível mais baixo DE SEMPRE, desde que existe o programa, ou seja desde 1998, remetendo para a inatividade ou para a emigração, milhares de jovens adultos altamente qualificados e interrompendo milhares de projetos de investigação científica.
A cega cruzada revolucionária do ministro Crato, para além de arrasar políticas e estruturas essenciais da educação portuguesa, que, em muitos casos, demoraram décadas a consolidar, tem a característica de nada criar para as substituir. Agora foi a vez da ciência. O que se segue? E o que restará para fazer crescer alguma coisa no futuro?
Pacheco Pereira referiu, há pouco tempo, que o governo do seu partido (PSD) e do CDS não se limitava a destruir o que o país construiu nas últimas décadas, mas, estava a salgar a terra para que nada crescesse nos próximos anos. E ele lá conhecerá os seus companheiros de partido no governo. “Essa gente” como os designou.