29 julho 2015

Elsa Ligeiro
Verão com José Cardoso Pires

Uma boa proposta para férias é a de passar este Verão de 2015 na companhia de José Cardoso Pires, um esquecido mas incontornável autor da Literatura Portuguesa do século XX.
Só um Ensino que não preza a arte literária pode colocar na sombra um autor que retratou como nenhum outro as décadas cinzentas da ditadura portuguesa. E com um engenho só ao alcance dos grandes escritores.
A minha sugestão vem acompanhada de 4 novas edições dos seus livros, na editora Relógio d’Água, que trazem ainda o bónus de três prefácios assinados por destacados autores portugueses da actualidade: António Lobo Antunes (A  Balada da Praia dos Cães),  Mário de Carvalho (O Anjo Ancorado),  e Gonçalo M. Tavares (O Delfim).
O quarto título, De Profundis, Valsa Lenta, mantém o prefácio da primeira edição (1997), do médico João Lobo Antunes.
Dos três novos prefácios, o único que não está à altura do livro é o que acompanha A Balada da Praia dos Cães (adaptada ao cinema por José Fonseca e Costa).
Está assinado por António Lobo Antunes, um grande escritor mas que aqui se limita a apontar o óbvio: que o livro tem uma arquitectura perfeita e que José Cardoso Pires foi e continua a ser o seu melhor amigo. Esquece o autor de Memória de Elefante que a amizade, ao contrário do amor, não se declara, pratica-se.
O texto de Mário de Carvalho, sobre O Anjo Ancorado, é todo ele perspicaz e excelente literatura, o que enriquece a edição de um livro que é só por si imprescindível em qualquer biblioteca: “Mal de vivre. Anjos ancorados, voo travado pelas cadeias do conformismo que os amarram à pétrea circunstância de um período histórico na aparência imobilizado.
Há autores, grandes autores, que se emancipam das contingências do espaço e do tempo. São eles que apelam aos leitores que sabem lidar com o espaço e o tempo, e não aos que se deixam tão-somente confinar aos horizontes de uma paisagem inerte”, escreve Mário de Carvalho.
Mas é Gonçalo M. Tavares que escreve deslumbrado sobre O Delfim (também adaptado ao cinema por Fernando Lopes), num começo delicioso: “Palavra rodeada de pedras por todos os lados. Uma ilha invertida”, metaforea o autor de Aprender a Rezar na Era da Técnica.
E sobre o autor do O Delfim, acrescenta: “Ler a prosa de Cardoso Pires é ter a sensação de que aquelas páginas surgiram naturalmente assim, já impressas. Como se o emissor das letras fosse a própria página, e o seu instinto natural, e não uma figura exterior. Que extraordinário escritor! Que extraordinário escritor é José Cardoso Pires”, exclama embevecido Gonçalo M. Tavares.
Partilho o deslumbramento.
E para quem ainda não sabe, recordo que José Cardoso Pires nasceu na aldeia de Peso, concelho de Vila de Rei, no dia 2 de Outubro de 1925, há precisamente 90 anos.
Faleceu em Lisboa, a 26 de Outubro de 1998, depois de, em 1995, ter sofrido um acidente vascular cerebral que lhe provocou uma morte branca, experiência que relata no livro De Profundis, Valsa Lenta.
Um último fôlego de um autor que merece o nosso Verão.

28/07/2015
 

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