JOSÉ DIAS PIRES
FALA DE MAIS QUEM FEZ DE MENOS
O fazer e o falar divergem apenas nas terceiras e quartas letras — ze la — e isso faz toda diferença. Por menor que seja a sua obra, quem faz, para cumprir uma obrigação, um compromisso, um programa, faz toda a diferença: zela. Quem fala, até pode falar muito e muitas vezes, e dizer muito pouco ou quase nada. Sendo subtil, esta é uma diferença substancial.
Nos dias que correm, quando começam a agitar-se as velhas palavras de ordem de todas as campanhas eleitorais, o velho provérbio «Entre falar e fazer, há muito que dizer» merece uma atualização: «Entre falar e fazer, há muito para fazer». E esta modificação faz toda a diferença. Convida-nos a pensar se vale mais a palavra de quem diz «devia ter-se feito» ou o ter-se feito o que corresponde à palavra dada?
Até ao final do verão, os arautos da verdade relativa de quem diz «faça-se!», sem nada ter feito, hão de insistir na gasta tecla da falta de memória. Memória essa que é, por certo, do tamanho daquilo que veem: curta.
Percorrerão quilómetros, pelas boas estradas que os que criticam implementaram, para defender, nas feiras organizadas pelos autarcas dos lugares, o comércio tradicional, pelo qual nada fizeram, antes pelo contrário.
Falarão da importância da preservação das memórias, do património, das tradições, às portas dos espaços museológicos onde essas memórias, património e tradições foram, ou serão, pelos autarcas que criticam, preservadas.
E dirão que há museus a mais e memória a menos. Sem propostas plausíveis, para além dos lugares comuns, darão ênfase natural à crítica e ao julgamento sem fundamento, mas esquecer-se-ão da avaliação efetiva.
E boa a divergência, quando acrescenta. É na discussão e no conflito de ideias que aumenta o nosso conhecimento e se abastecem os pontos de vista que podem ter passado desapercebidos.
É sempre assim: fala de mais quem fez de menos.
Será que acreditam que do Louriçal aos Cebolais, de Malpica a S. Vicente da Beira, da Lousa a Sarzedas, as pessoas não sabem descobrir que há quem por lá passe sem nada ter feito ou acrescentado, apenas movido por uma acurada capacidade em olhar e apontar os defeitos nos outros, do que analisar, enxergar e tentar corrigir os seus próprios defeitos, aliás, limitações?
«Os homens de poucas palavras são os melhores», escreveu William Shakespeare, por que sabem que o que fizeram pode ser transformado, para melhor, acrescento.
Disse Ghandi: «É melhor que fale por nós a nossa vida, do que as nossas palavras».
O amanhã, portanto, será fruto das escolhas de hoje e das ações que lhes correspondem, que marcam, de verdade, a real distância entre o falar e o fazer.