10 de janeiro de 2018

Antonieta Garcia
QUE 2018 (N)OS PROTEJA!

Às vezes apetece ser preguiçoso. Ou indiferente. Deixar andar. A ideia de mudar o mundo pertence a outros tempos? Sem desistir de o melhorar, creio que cada vez contamos com menos pessoas capazes de se interessar pelo Outro. Veja-se como o drama dos refugiados foi abandonado nos noticiários. E o dos sem-abrigo. Dos pobres. Há solidariedade, mas pontual, escassa, efémera. Quem precisa, precisa sempre e as datas de ser bom são tão curtas...
As notícias privilegiam agora, tendencialmente, novelas de faca e alguidar, desandas no governo, nos políticos (exceção ao PR), nas gentes de poder… Encantam-se com distúrbios de tarados e malfeitores… Exploram até ao tédio um mundo-manicómio cheio de doentes em regime ambulatório. Falam de trivialidades e do que não viram, não ouviram, não analisaram; são ecos, enfastiam, fartam. Enfeitam-se com ar de arrogância. Uns poucos substituiriam tudo quanto é jurista e com a sapiência que a vida ainda lhes não deu, julgavam e penalizavam, com certeza ou sem ela, crimes que ouvem dizer. Como em tudo, sabem-se honrosas exceções a esta regra…
Há outros responsáveis. O último capítulo de Maduro, Presidente da República da Venezuela, com o “pernil de porco”, mostra que o exemplo, às vezes, vem de cima. Vale tudo: mentiras, ora maldosas, ora ignorantes, ora porque sim. Sacudir a água do capote é hábito velho e, com o indicador em riste, acusou, acusou, acusou Portugal, ali à mão… Conhecida a verdadeira saga, conclui-se que Maduro estava mal informado: a responsabilidade não cabia aos portugueses. Culpou, então, os Estados Unidos de “sabotagem”; o povo venezuelano não cumprira a tradição do consumo do dito pernil, no Natal. Sobre dívidas, cala-te boca! Acredita-se em quem? Em quê? Casa onde não há pão…
E assim se vai minando o modo seguro de viver, a esperança extenuada… a definhar. Vá lá, quando chega o Natal e o Ano Novo, o desejo de renascimento da humanidade solta-se, e os votos de “Boas Festas” e de “Bom Ano”, tornam-se frases com sucesso porque dizem bem o que cada um sente, ganham sentido. Vindos de amigos com abraço forte batem-me na alma, comovo-me, piegas…
Minhoquices de meditabunda apanhada em tempo de corrida, quando o devagar já é mais recomendável? Certo é que a nostalgia abre a memória de um mundo em que até se decorava a regra do sono: “Quatro horas dorme o santo, / cinco ou seis quem não é tanto, / sete ou oito toda a gente, / nove ou dez quem está doente, / onze horas dorme o porco / e mais quem estiver morto.//”
Então, até o santo dormia 4 horas! Agora, ansiolíticos alternam com estimulantes para acalmar e para acordar. O corre-corre frenético mergulha-os num ritmo louco em demanda de cumprimento de prazos, de objetivos. O dom da omnipresença, que as novas tecnologias facultam, impede que o pé abrande no acelerador. Do acordar ao deitar andam a cem à hora. O tempo todo preenchido. Reduzir a velocidade? Mas como? Onde está o travão? Comem à pressa e mal, não há pausas, e as fontes de estresse, de fadiga e de angústia, multiplicam-se.
Um cachopo de onze anos, agarrado a um tablet, prenda de Natal, irritava-se:
- Que seca!
- O que é seca?
- O tempão que isto demora a instalar! Nunca mais posso jogar!
- E o que tens para fazer?...
Tempão significava uns minutos. Seguiu-se sermão, sem canto, mas em voz firme. Em jeito de pergunta/resposta falou-se do interesse de viver mais devagar, sobre a fruição da vida que pede conversa, cavaqueira, diálogo, essenciais à construção de amigos reais…
O processo de instalação do tablet finalizara. O meu tempo de antena findara. Agora era a vez de sua excelência, o jogo.
Valeu o palavreado? Sei lá! É tudo rápido, acelerado, urgente, fátuo. O mundo desorganizou-se; o SMS facultou a criação de palavras abreviadas com as quais compõem frases desconexas que só eles entendem, só eles entendem… Sem smartphones, hiperativos ficam sem alma. Não querem sair do canto onde estão, sempre ligados ao mundinho que os atrai e adoece. Precisavam tanto de parar, pensar, falar com gente, observar e ver… de pedir ajuda a um deus que não anda por ali... Que 2018 os proteja!

10/01/2018
 

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