Edição nº 1785 - 22 de março de 2023

Elsa Ligeiro
O ELOGIO DO JORNALISMO

Há 34 anos, Castelo Branco era uma cidade ainda mais provinciana, com uma matriz profunda de Estado Novo, apesar da Revolução do 25 de Abril de 1974.
Com um presidente que exerceu por quase duas décadas o poder, assente num desenvolvimento centrado na cidade e dando às freguesias apenas o indispensável que a política nacional ia exigindo.
Um desenvolvimento assente na construção civil, dando aos empresários do sector ganhos obscenos que ainda hoje falta contabilizar e que nem os escândalos (há práticas políticas eticamente reprováveis que todos conhecem, mas que são difíceis de provar em tribunal por estarem no limbo da legalidade) conseguiram evitar práticas comuns de compadrio e troca de favores.
Espero, enquanto cidadã, que um dia historiadores qualificados possam registar para as gerações vindouras essas décadas de governo municipal de César Vila Franca.
Com a entrada de Portugal na CEE, as obras públicas multiplicaram-se e os apetites também; mas isso fica para uma próxima crónica.
Nada disto é literatura, apenas reflexão sobre a nossa história comum, e basta folhear a Gazeta do Interior de há 34 anos para perceber que o jornalismo pode ser a história viva de uma cidade.
A minha curta passagem de seis meses pelo jornal permitiu-me entender o jornalismo como um motor da cidadania participativa.
E como o jornalismo deve ser um suporte noticioso das pequenas comunidades; com as questões do trabalho e a vida dos operários, atualmente tão ignorada, numa sociedade que teima em tratá-los apenas como números da Segurança Social; e como notícia só quando fazem greve ou a empresa onde trabalham encerra.
O jornal deve ser o repositório e a fixação do que é relevante no nosso quotidiano, com uma informação sobre o que influencia verdadeiramente a vida das pessoas (a reportagem deixou de existir nos jornais regionais e é uma pena); não a agenda protocolar do presidente do município e dos seus vereadores.
A opinião nos jornais também deve excluir quem exerce o poder seja ele político, económico ou religioso.
São sobre estes temas nucleares que os colunistas independentes devem falar sem rodeios e com independência, numa reflexão sobre os problemas das suas comunidades.
Com a opinião a ser entregue a operários, enfermeiros, sindicalistas, alunos, professores, trabalhadores de centros de chamadas, caixas de hipermercados, comerciantes…
Castelo Branco há 34 anos não tinha o Centro de Cultura Contemporânea, nem um Cine Teatro requalificado; uma Biblioteca na Rede Pública, Cybercentro e vias de comunicação que permitem acolher (não só turistas, como os políticos sem imaginação insistem em falar) mais comodamente quem nos visita.
Os equipamentos culturais de qualidade disponíveis devem-se transformar em centros de encontros das múltiplas comunidades, especialmente das mais jovens, fomentando o apelo ao conhecimento em geral e ao território que habitam em particular.
Temos um Concelho agradável, mas sem projetos adequados a uma sociedade que se quer com identidade cosmopolita e com ofertas diferenciadas.
E falta-nos a preocupação em fixar e aumentar a população residente; que devia ser a nossa grande prioridade estruturante.
Temos um município que continua a centralizar em vez de distribuir competências e riqueza pelas freguesias do Concelho.
Na passada quinta-feira reencontrei o jornalista José Mário Silva, em Beja. Durante muitos anos editor no Diário de Notícias.
Foi comovente a nossa conversa sobre os jornais e o jornalismo; e recordei alguns jornalistas, verdadeiros intelectuais que ainda conheci, como António Paulouro ou Pedro Rolo Duarte; e o Fernando Madaíl e Francisco Duarte Mangas, ex-jornalistas do Diário de Notícias com quem ainda convivo e por quem tenho uma admiração profunda.
E cresceu um desejo muito grande de voltar aos jornais, de fazer parte (como gestora) de um jornal altamente evoluído.
A tecnologia sofisticada pode ser uma parceira de importância vital à hora de comunicar (especialmente notícias).
Ainda há algum nevoeiro dentro do futuro dos jornais que não nos deixa ver claro (Eugénio de Andrade também o escreveu referindo-se à poesia); mas imagino que serão os princípios básicos do jornalismo a prevalecer: a vigilância aberta e honesta sobre o poder seja ele político, económico ou religioso.
Porque alguém terá que vigiar o exercício da democracia e os direitos adquiridos com tanto suor e lágrimas; alguém terá que exigir competência no exercício das funções para as quais os nossos representantes são eleitos
E esse alguém pode e deve ser um(a) jornalista.

22/03/2023
 

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