José Dias Pires
OPOSTOS E APOSTOS
Gosto de quem está do outro lado e que, situado no mesmo plano do mesmo eixo, olha de lado diferente e para o lado oposto por convicção fundamentada, porque ser convicto não é ser convencido, antes pelo contrário: é ser capaz de elevar o contraditório de uma outra perspetiva. Gosto de quem não teme objetar e ousa propor, especialmente quando isso significa colocar obstáculos à tentação ao facilitismo.
Ser oposto é, evidentemente, muito diferente de ser do contra.
A primeira condição implica conhecer, estudar e enfrentar quem disso é merecedor e exercer a cidadania. Por seu lado, ser do contra é o exercício simplista da “cidadanice” (o ato comezinho de quem se presume ser cidadão ativo e se resume apenas a ser baluarte do deserto de ideias).
Ser oposto é confrontar, sem tibiezas e olhos nos olhos, quem, no exercício de qualquer poder, suscita, merecidamente, dúvidas que implicam respostas e ações, o que dá muito mais trabalho e acarreta muito mais responsabilidades que o criticar com a ponta dos dedos usando apenas a sombra mal projetada do cerebelo através de um teclado impávido, prática cada vez mais visível nas redes sociais de todas as vaidades e desaforos.
Ser oposto é ser capaz de ser afirmativo com o sorriso tranquilo de quem não teme as conversas difíceis, sem medo de elogiar as tarefas bem-sucedidas e rejeitar as práticas erradas sem substrato e sentido.
Ser oposto é ser maduro e ter a coragem de procurar saber que a imperfeição é, à partida, a ponte que liga sempre as duas partes em questão. Mas também é a vontade de aceitar que entre o oposto e aquele a quem se opõe pode haver uma vontade intrínseca de procurar encontrar a sabedoria.
Depois temos os apostos - aqueles que incapazes de se oporem, de forma estruturada, ao que quer que seja, primam pela teimosia persistente do ser contra, pela resistência às ordens, pela recusa de compromissos ou responsabilidades e, por manifesta dificuldade de procurar ouvir ou por não saber como fazê-lo, não perdem a oportunidade de se aconchegarem a quem lhes pareça cheirar a benfeitoria pessoal.
A ignorância gerada pela surdez social é frequente no comportamento dos apostos que tendem, sempre que podem, a transgredir os limites estabelecidos, a discutir sem aceitar qualquer atribuição de responsabilidade, numa hostilidade dirigida para os outros, regra geral, através de uma agressividade verbal bacoca e irritante.
Abomino os apostos que fazem da assessoria real ou fictícia profissão e demanda de vida adequada ao seus interesses comezinhos e interesseiros, sempre conveniente aos que gostam (e aceitam) ser bajulados.
Os apostos procuram sempre ser aparentemente airosos e pouco se importam que, por conveniência ambivalente, sejam como os bois, jungidos ao carro ou, como se faz às cavalgaduras, metidos aos varais da carruagem, porque, na verdade, passam pela vida mascarados de menos vis, e disfarçados de bonomia sempre à espera do Dia de Tudo Mudar para Ficar na Mesma onde se afirmam os trapaceiros transvestidos de alquimistas.
Os apostos, que entre nós pululam, são apêndices de enganos, delicodoces, que meticulosamente preparam o Dia Nacional das Cangas nos Pescoços.
Gosto de quem se opõe e que, com independência, se sente obrigado sem medo da antecâmara do bem-haja.
Abomino quem se apõe para aceitar viver obrigado ao princípio da canga dependente.