Antonieta Garcia
CRAVO AO PEITO
Viva lá, senhor Abril, com cravo vermelho ao peito!
Ficam-lhe bem os adornos, as cores, o talento musical que, na Primavera, acompanham a vida livre.
Ora, esta é a hora de pendurarmos a memória no armário mais antigo e seguirmos a história que a criatividade guardou na arca velha. E as recordações divertem-se e riem, vestem-se e despem episódios que fazem sorrir. De vez em quando, com mais tempo solto, alegram a arrumação de antiguidades várias: esta peça adequa-se bem à direita, à esquerda menos mal e, ao centro... não havia de valer? E que linda fica a cidade, a casa...
No diário longo, exposto em rua escorregadia e com o apoio do Senhor dos Aflitos ouviremos muitas vidas a contar de si. Quando? Por exemplo, na época de exames, era um Deus nos acuda...
O esquecimento premiava quem pouco estudava e gente que embirrava com provas difíceis...
O pedido de ajuda dos mais angustiados, a toda a corte celestial, levava tardes a esclarecer. Lembram-me os dias de nevoeiro e tardes geladas, enormes, mas eficazes, na Torre dos Ferreiros da Guarda. Com os braços abertos e preces com muitas linhas de escrita e olhitos chorosos, suplicavam tudo ao Senhor dos Aflitos; era rogado até o milagre do desaparecimento de folhas de manuais escolares com maiores problemas...Espicaçavam deuses e santos e requeriam: Desceram do Céu à Terra / Dois anjos embaixadores / A buscar a Primavera, / Que lá no Céu não há flores//.
Antes na Terra do que o Céu sem flores. Este era um mundo diferente; de coração apertadinho e, vá lá saber-se, com quantas dúvidas, diziam a sua crença: Quem disser que o Sol chora / Digam todos que é mentira; / Como pode o Sol chorar, / Se ele é o Rei da alegria?! //
- Nada é perfeito! Nem no Paraíso!
São velhas questões de fé. Abril, Primavera, Sol, Céu e Terra eram Ciência; os crentes acariciavam palavras velhinhas, a razão a pavonear-se e a regatear o lugar onde havia vida e se cumpriam preceitos conduzidos pelo sonho e pelo jeito de investigar em novas artes.
Ouvimos: Aprende-se que eu sei lá, com o saber de experiência feito! Sem ser fácil. Verdade; provava-o Luís de Camões que entendia a Ciência, o Amor e a(s) Fé(s): “Vejam agora os sábios na Escritura, que segredos são estes da Natura?” (Canto V, 22)
In illo tempore, muito havia para indagar em todos os conhecimentos. E aqui temos Camões com a literatura agora e sempre, em festa.
Celebramos os 500 anos do Poeta, mais os cinquenta anos da revolução de Abril... e esta é a ditosa Pátria, minha amada.
E que Pátria tem sido? À maneira de Pessoa poderíamos tecer Portugal. Queria, todos os dias, encontrar a pedra de sonho para a atualização da Beira, do país. Fazíamos um roteiro e um “edifício” para venerar a Terra Mãe e a saudade. Todavia:
Uma saudade me mata, / Uma ausência me detém, / Uma esperança me anima: / Sobre tempo, tempo vem. //.
Ou: Eu hei de mandar fazer / Torres com altas varandas / Já que te não vejo amor, / Vejo as terras por onde andas “
Viva lá, senhor Abril, com o lindo cravo vermelho ao peito, que a todos diz bem...!