João Carlos Antunes
Apontamentos da Semana...
POR ESTA SEMANA abre a Feira do Livro de Lisboa. Mais que feira, é já a festa do livro. São os quiosques de comida, de petiscos, as inevitáveis farturas (a que não resisto) e, a toda a hora, momentos para apresentações de novos livros, conversas com os autores, reflexões literárias, música e poesia. Tudo isto num espaço sublime, o Parque Eduardo VII, verde onde apetece sentar e refrescar e com vista única sobre o Tejo. Não me recordo de haver algum ano, exceto o período pandémico, ter falhado o evento. E não recordo de alguma vez ter levado lista de compras. Gosto de ir à feira/festa do livro com o prazer da descoberta, folhear e admirar a capa e ter aquele feeling que tantas vezes falha e nos deixa com o livro abandonado ao fim do primeiro capítulo. E agora vou sem qualquer objetivo de compra, porque cada vez mais temos a consciência do tempo que nos resta, sei que não vou conseguir em vida ler todos os livros que fui juntando ao longo de uma vida e que continuam à espera de serem lidos, a acrescentar aos livros com que um amigo, poeta e crítico literário, regularmente me presenteia. E é também uma questão de espaço, que um outro meu amigo tem em tamanho que lhe permite estantes que se estendem por largas (muitas) dezenas de metros.
Por isso, irei mais uma vez à Feira do Livro, não sei é se irei comprar algum. Mas palpita-me que vai acontecer como quando, com o jornal debaixo do braço, comprado no saudoso quiosque do Vidal, onde também se faziam, sob o olhar sorridente do Zé do Quiosque, tertúlias instantâneas em que se discutia política, futebol e livros, como quando, dizia eu, entrava de seguida na Rosel, prometendo a mim mesmo que desta vez seria só um café. Entrava, sentava-me e logo o senhor António, solícito, fazia a pergunta que já continha a resposta: café e bolinha, não é senhor professor? E eu, incapaz de resistir às melhores bolas de berlim que esta boca já provou, como não resisto a um livro, aceitava a sugestão como uma inevitabilidade do destino.
Na Feira do Livro não se vive, pelo menos nunca dei conta, a imaterialidade do livro no formato digital, que muitos leitores por boas e variadas razões preferem. O livro, como produto palpável, distinto pelo tamanho, capa, até a mancha gráfica do texto e pela vida que tem lá dentro. Tem tudo o que é necessário para a ligação empática com o leitor, muitas vezes uma ligação para a vida inteira.
Revejo-me muito no que escreveu Manuel António Pina: “Às vezes pergunto-me quem raio seria eu se, em vez dos livros que li, tivesse antes lido os que não li. Provavelmente cruzar-me-ia comigo na rua e não me reconheceria”. É isto, o livro também contribui para a construção do nosso caráter e para a nossa forma de estar no Mundo. E não só. Esta semana no Público, o jornalista António Rodrigues, cita estudos que dizem que o livro, faz maravilhas para o corpo e a mente. Um estudo realizado pelo dr. David Lewis mostrou que apenas seis minutos de leitura por dia podem reduzir os níveis de stress em 60%, diminuindo o ritmo cardíaco, aliviando a tensão muscular e alterando o estado de espírito. E que a leitura previne o Alzheimer ajudando a ter uma vida mais saudável, seja a leitura de livros no formato tradicional em papel ou em qualquer suporte digital: o que importa é ler, ler amiúde, ler quotidianamente. Pois que se leia, na certeza de que a presença de livros em casa é já meio caminho andado para a leitura.