Edição nº 1902 - 2 de julho de 2025

João Carlos Antunes
Apontamentos da Semana...

TENHO UM AMIGO que só come fruta da época. Por várias razões, todas elas válidas. Pelo sabor, pela doçura e consistência que a longa permanência em frigorífico lhe rouba. Por louvável motivo ambiental, na redução da pegada ecológica, com a fruta da época produzida por produtores locais a chegar ao consumidor final em muitas mercearias de bairro ou em grandes superfícies a apostar na produção de proximidade. E porque há fruta que pela sua natureza só é possível comer na época, como a cereja e a melancia. O azar do meu amigo é que não gosta, ou pelo menos não aprecia, uma destas frutas que mencionei: a melancia. A fruta rainha do verão, diria que a fruta do povo, que a aristocracia despreza (a não ser se for comida à beira de uma piscina). E não conheço restaurante de renome que inclua a melancia no cardápio das frutas. Mas o povo é inteligente, sabe o bem que faz quando faz da melancia a sua fruta de verão. Desde a melhor forma de nos hidratarmos nos dias ardentes, até ao privilégio de, com muito poucas calorias, nos podermos saciar. E tem muitas outras virtudes de que a minha cultura googliana vos dispensa. Mas há uma que não resisto a referir aqui: o artista palestiniano Khaled Hourani desenhou uma fatia de melancia e batizou-a de “As Cores da Bandeira Palestiniana”, o que a popularizou entre ativistas de todo o mundo.
O meu pai também as cultivava, misturadas com o milho ou com as espécies hortícolas, no regadio da quinta. E o meu avô “escondia-as” no meio da palha, por baixo da grande azinheira que lhe servia de sombra, nas sestas das tardes de verão e onde, no pino do calor, se deliciava com o seu sumarento tesouro escondido.
Por isso, o meu histórico dita que o verão não é verão que se tenha se não tiver melancias, preferência de muitos quilos, daquelas que racham logo no espetar da faca que as vai abrir. Mas a escolha da melancia certa exige sabedoria. Exige do comprador habilidades de raio-X. Batemos nela com o nó do dedo indicador, ouvimos o seu eco, fazemos a interpretação da mensagem e, mesmo assim, ao abri-la, tanto pode acontecer um doce milagre como uma deceção aquosa…
E agora ficamos à espera das melancias do Ladoeiro, as melhores de Portugal e arredores. Para substituir de vez, por este ano, as marroquinas e as espanholas que podem ser bem verdes por fora e vermelhas por dentro, mas não têm, garantidamente, o sabor e a doçura das nossas. Senhores produtores do Ladoeiro, venham elas, que nós (não contando com o meu amigo) estamos ansiosos por as ter na nossa mesa.

02/07/2025
 

Outros Artigos

Em Agenda

 
29/05 a 12/10
Castanheira Retrospetiva Centro de Cultura Contemporânea de Castelo Branco

Gala Troféu Gazeta Atletismo 2023

Castelo Branco nos Açores

Video