16 de dezembro de 2015

Lopes Marcelo
O MADEIRO

Uma das mais belas e significativas tradições comunitárias da nossa Beira Baixa raiana é constituída pelo Madeiro. Verificam-se algumas alterações que representam pequenas adaptações à evolução do tempo, como sejam o uso de moto-serras e de tractores. Contudo, as verdadeiras tradições resistem à sequência das gerações, mantendo o seu ritual e o seu sentido social e simbólico que constituem valores do nosso património cultural e referências da Identidade cultural comum.
Eram os rapazes das sortes que, perfazendo os dezoito anos iam nesse ano à inspeção militar, se juntavam na noite de sete para oito de Dezembro. Antes tinham recolhido garrafões de vinho e alguns cabritos generosamente oferecidos. Para se reunirem, tocavam o búzio e lá seguiam durante a noite por mais fria ou chuvosa que fosse até aos troncos de sobreiras e de azinheiras, já anteriormente selecionados, quer tivessem sido cedidos pelos proprietários, quer cortando-os sem autorização. O arranque ou o corte, a remoção e o carregamento das grandes raízes e dos troncos de preferência de árvores já secas, são trabalhos por todos realizados pela calada da noite, com grande entrega e entusiasmo. A seguir, era a substancial bucha comida junto à fogueira que se mantinha acesa: azeitona, queijo, pão, carne assada e vinho e água-ardente para dar têmpera, aquecer os corpos e manter os espíritos alegres.
Ao início da manhã do dia santo da Imaculada Conceição conduziam o carreiro dos carros de bois (agora os tractores) bem carregados de lenha grossa até ao adro da igreja de forma a coincidir com o fim da missa, fazendo-se anunciar com vários gritos dos mais jovens: já lá vem o madeiro! Lá vem o madeiro! O povo que ia enchendo o adro esperava e festejava. No carro ou tractor da frente e em cima dos troncos mais altos, vêm alguns rapazes acompanhados de um acordionista, cantando o Menino Jesus. Um deles traz às costas um cabrito, outro levanta bem alto um ramo de laranjeira bem carregado de laranjas, outro um garrafão de vinho e ainda outro toca o búzio.
Chegados ao adro ouvem-se muitos vivas:
- Viva o Menino Jesus que nos deu forças para carregar o madeiro!
- Viva quem nos deu o madeiro!
- Viva o ganhão dianteiro e também o traseiro!
Com grande entusiasmo procedia-se em expontânea entre-ajuda, à descarga e ao amontoar dos troncos no meio do adro.
Toda a rapaziada se juntava num grande almoço à base de cabrito, borrego e chanfana, não faltando o típico arroz-doce. Depois, seguia-se o baile para toda a população. O madeiro lá ficava no adro até à noite de natal, para ser aceso já bem perto da Meia-noite. Quem acendia e orientava toda a festa dessa noite, era o juiz do madeiro, entre vivas: viva o Ti Cesteiro, que é o juiz do madeiro!(por exemplo). Bebia-se vinho, água-ardente e jeropiga, acompanhando-se com filhós e bolos variados, sempre à volta do calor do madeiro que lá ficava a arder durante muitas noites. Ao apelo do seu calor e mítico significado comunitário, os homens ali se reuniam para contar histórias e cantar o Menino Jesus.
Embora sejam cada vez em menor número os rapazes das sortes nas nossas vilas e aldeias, ainda está bem viva esta tradição que bem pode ser revisitada e divulgada como elemento patrimonial de um esclarecido marketing territorial que valorize as nossas terras, os seus usos e costumes e a sua cultura popular.

17/12/2015
 

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