Edição nº 1690 - 12 de maio de 2021

José Dias Pires
AS INDEPENDÊNCIAS DEPENDENTES

Não é difícil fazer futurismo: nas próximas eleições autárquicas serão muitos os candidatos não enquadrados partidariamente ou encaixados artificialmente em “partidos de aluguer”.
Mas quantos deles serão, efetivamente, independentes?
Haverá um bom número de autarcas desavindos com os partidos que anteriormente os elegeram ou estrategicamente desafetados aos partidos onde nunca seriam eleitos, haverá ainda um conjunto significativo de candidatos que de independência em independência saltam de partido em partido como as rãs de nenúfar em nenúfar. Enfim, poucos serão verdadeiramente independentes, o mesmo é dizer: autónomos pessoal e ideologicamente dos que vão tomar por adversários e aos quais se querem apresentar como alternativa.
Na verdade, quando foi legislado, a ideia subjacente à aceitação de candidaturas de independentes era a de alargar a participação eleitoral a cidadãos que, sem militância partidária conhecida ou em tempo significativo abandonada, quisessem participar nos processos eleitorais locais, pondo fim ao exclusivismo partidário. Uma boa ideia plasmada em texto legal que não foi capaz de prever um efeito perverso do que veio gerar: candidaturas de ex-militantes partidários que não conseguiram ver-se apoiados pelos seus antigos partidos, isto é: candidaturas geradas por conflitos e não por conteúdos ideológicos bem sustentados e geradores de valores, princípios e propostas que, apesar de divergentes, mereceriam, neste caso, respeito e compreensão.
Há, nestas independências repentinas, muito de artificial, de oportunista e de enganoso. Não duvido que se esta situação tivesse sido devidamente prevista, respeitando a verdadeira intenção dos legisladores, a lei teria dificultado independências de última hora ou alugueres partidários de “interessantes e interessados independentes” que provam, neste último caso, nunca o terem sido pois de autónomos nada têm e são inequivocamente dependentes de estruturas partidárias sem expressão mas ótimas para “alugar” sem os custos nem o trabalho que uma candidatura independente deveria ser capaz de assumir.
Estas são razões mais que evidentes para que esta lei, na revisão que os independentes tanto reclamam, tivesse a coragem de impor que um cidadão só pudesse concorrer como independente se provasse não ter qualquer vínculo partidário há, pelo menos, dois anos.
Todos estamos conscientes de que a vida partidária local nem sempre é exemplar e que as escolhas dos partidos podem até parecer menos razoáveis.
Deixem que romanceie o que, tendo já acontecido, pode perfeitamente vir a acontecer:
Nas próximas eleições autárquicas, na cidade A o partido B optou por candidatar o líder da concelhia, o senhor C, e o ainda presidente da Câmara, o senhor D decidiu avançar sozinho como independente. Para evitar dificuldades operacionais contactou os partidos E, F e G e gerou um coligação na qual confortavelmente afirmará a sua liderança “independente”.
Mas haverá ainda mais dois candidatos sem apoio partidário: os senhores H e I. O primeiro avançou com a sua candidatura quando o seu partido o não escolheu. O segundo tinha “tudo” orquestrado para avançar com sucesso no seu partido de sempre, mas a opção final foi outra. Por isso decidiu avançar de forma “independente” apoiado especialmente pelo tecido empresarial urbano.
Existe uma Associação Nacional dos Movimentos Autárquicos Independentes (AMAI), compreensivelmente criada para resolver os problemas que são adjacentes a tais movimentos. Contudo, há uma questão que fica a pairar: terá a AMAI promovido verdadeiramente a independência dos seus associados ou, antes pelo contrário, promoveu níveis de dependência que reduzem a incongruente a sua própria definição?
Nesta confusão gerada, quantas vezes, por egocentrismos exacerbados e por caciquismos sonhados, as independências são de facto, e cada vez mais, muito dependentes.

12/05/2021
 

Outros Artigos

Em Agenda

 
07/03 a 31/05
Memórias e Vivências do SentirMuseu Municipal de Penamacor
12/04 a 24/05
Florestas entre TraçosGaleria Castra Leuca Arte Contemporânea, Castelo Branco
14/04 a 31/05
Profissões de todos os temposJunta de Freguesia de Oleiros Amieira

Gala Troféu Gazeta Atletismo 2023

Castelo Branco nos Açores

Video