José Dias Pires
AS FRONTEIRAS NA POLÍTICA LOCAL
Quem está na vida política apenas e declaradamente para servir a comunidade que lhe outorga responsabilidades, não o quererá — porque nada fez (nem fará) para que assim seja. Mas a verdade é que, no que diz respeito ao percurso que nos há de levar às eleições autárquicas de 2021, o vírus da baixa política e as ações rasteiras que lhe estão associadas sucedem-se de forma repetida e inaceitável e o concelho de Castelo Branco, infelizmente, não passou impune.
Apesar de não necessitarem de passaporte para que possam ser percorridos livremente, os territórios da ação política local exigem o conhecimento das fronteiras que nos obrigam, a todos os que neles nos movimentamos, aos valores e princípios que devem acompanhar sempre a dignidade humana.
A não resposta a tal exigência, ou melhor: o seu ignorar intencional, têm determinado um desencanto crescente das pessoas perante a ação política e os seus atores.
Este desencanto é o resultado de um acentuado facilitismo que anula o pensamento crítico refletido e fundamentado.
Na verdade, a tendência para a generalização ajuda a colocar num mesmo plano aqueles que conhecem, respeitam e sabem escolher o território dignificado e dignificante da política e os outros que apenas se preocupam com os seus interesses mesquinhos despidos de quaisquer valores.
Depois há ainda as vozes, cada vez mais antigas (aparentemente democráticas, mas profundamente autofágicas), do ser contra porque sim, do “És poder? Sou contra! Não gosto de quem manda e tu és líder? Sou contra! Prefiro o coletivo decisor! Pertences a um grupo organizado? Sou contra! Temo a acefalia de rebanho e prefiro uma liderança forte, mas coletiva!”
Incapazes de criticar escolhas e apontar caminhos alternativos acompanhados dos respetivos custos reais e implicações concretas, os opositores da permanência (e em permanência) realizam-se nestas diatribes e acabam por contribuir para o desencanto e a deseducação que levam à menorização e ao desprezo pela política sem darem um passo em frente ou acara (como diz o povo) pelo que dizem defender.
As fronteiras que a todos nos desafiam são claras e determinam confrontos que importa identificar e sublinhar: A democracia contra a autocracia; A liderança afirmativa contra o caciquismo; As ações claras e sustentadas contra os estratagemas subterrâneos; A coragem social, cultural e emocional contra a cobardia que se disfarça de heroísmo; A verdade verbal e corporal contra a mentira da maquilhagem plástica do bem parecer; A solidariedade moral nos acertos e nas falhas contra o egocentrismo de quem assume sozinho as vitórias do trabalho de muitos e devolve para estes os insucessos que também são seus.
A política em geral e a política local em particular tem, devido à proximidade entre quem age e quem a ação é dirigida, uma evidência que é impossível contornar: a ação política não é uma profissão — é um serviço; logo, os atores políticos obrigam-se demonstrar que têm vida para além da política: uma vida profissional, familiar, comunitária e coletiva; que têm um saber que os capacita a definir objetivos, demonstrar competências e reconhecer necessidades; que se conhecem a si mesmos, que conhecem os outros, assim como conhecem os espaços e os tempos onde vão ter de se movimentar.
Quem ignora estas fronteiras e subverte os valores que lhe estão associados, promove a baixa política e as ações rasteiras que conjugam interesses duvidosos e jogos de bastidores habilidosos, disfarçados de pretensos gestos altruístas de quem não está na vida política para servir a comunidade que lhe outorga responsabilidades, nem quer promover o trabalho coletivo, antes produz teias e redes de interesses e conluio que apanham os incautos, enredam os dependentes e servem os interesseiros.
Se, por oposição, formos capazes de construir uma ponte de valores e princípios que seja o elo de ligação entre quem quer agir politicamente e aqueles a quem tal ação é dirigida, responderemos melhor às necessidades, respaldados por propostas e participações motivadas da comunidade e afastaremos definitivamente aqueles que, de forma enviesada, tentam, a todo o custo, livrar-se de serem engolidos pelas tempestades que eles mesmo criaram.
Esclarecida, a comunidade os julgará para que não passem incólumes, porque, de facto, não merecem qualquer confiança política.