Alfredo da Silva Correia
POBRE POVO NAÇÃO VALENTE - O SERVIÇO NACIONAL DE SAÚDE
Nunca tive muitas dúvidas que inverter uma cultura construtiva, quando a mesma até está a permitir bons resultados é um erro grave, pois não é fácil conseguirem-se hoje, na nossa sociedade bons factores produtivos, como seja pessoal com boa experiencia profissional e até uma boa capacidade de gestão. Esta observação será, sobretudo, mais sentida pelos mais conscientes em matéria de apreciação da qualidade da gestão em qualquer organização, seja ela um país, uma organização estatal, ou mesmo uma empresa privada.
Sei que há quem defenda que no Estado tudo se resolve com meros princípios políticos, o que na minha opinião é um tremendo erro, que tem saído bem caro na nossa qualidade de vida ao sermos conduzidos para a cauda da Europa, por não serem aplicados bons princípios de gestão. Não tenho muitas dúvidas, de que a grande diferença nos resultados da evolução socioeconómica de organismos estatais, está no facto da respectiva orientação incorporar ou não princípios de gestão, ou se são orientados apenas por princípios de mera política. Quando as decisões incorporam apenas estes, acaba por se pagar caro, sendo sempre uma questão de tempo. As orientações políticas incorporam normalmente uma visão dos interesses do político responsável, que se norteia sobretudo pelos interesses e visão do seu grupo, enquanto a gestão considera a lógica racional do que se está a decidir, sem consideração dos interesses do grupo político
No âmbito desta análise não tenho dúvidas que, por exemplo, chegará o tempo de termos que pagar caro o erro de, a certa altura, se ter invertido a cultura de gestão imposta pela troika em 2015 e que estava até a permitir bons resultados. Poderá dizer-se que desde então já passaram alguns anos, sem darmos por dificuldades de monta, também porque tem sido possível fazer crescer a nossa divida, sem grandes custos, o que nunca seria para sempre e agora até haver desculpas para as que se vão sentindo, com os problemas da pandemia e da guerra da Ucrânia. Não obstante, a verdade acaba sempre por chegar e ela será o resultado das orientações tomadas, quantas vezes há cinco e mais anos, sobretudo se elas não nos prepararam para quando as dificuldades se comecem a sentir, como agora nos está a acontecer. É sempre assim. A cultura instalada prepara-nos ou não para enfrentarmos as dificuldades que um dia chegarão, como resultado não só de meras decisões políticas, mas também das envolventes socioeconómicas internacionais. Quando elas chegam o sofrimento é sempre muito maior, acabando por chegar as evidências dos erros cometidos com decisões de mera política, sem consideração das realidades, como tem acontecido tantas vezes ao longo da nossa história. Normalmente, infelizmente a visão dos nossos políticos só considera as realidades actuais e nunca o que virá no futuro, o que gera sempre sérios problemas que acabamos por pagar na nossa qualidade de vida.
No âmbito destas reflexões considerando toda a problemática hoje vivida no nosso país no nosso Serviço Nacional de Saúde, não tenho dúvidas que os problemas vividos no mesmo não só, são comuns a toda a administração pública, como acabariam sempre por chegar. De facto são problemas resultantes de uma cultura instalada no nosso Estado, que não poderia deixar de conduzir a muito baixas produtividades. Estas estão bem evidentes na observação de que antes da chegada da troika na administração pública trabalhavam cerca de 700.000 trabalhadores, para em 2015 serem apenas cerca de 650.000 e actualmente já rondarem os 741.000. Para agravar esta observação o facto de não só se dispor hoje de mais instrumentos técnicos (meios informáticos que põem o cidadão a fazer muito do que antes era feito pela administração pública) mas, sobretudo, por apesar do aumento verificado se constatar que em todos os serviços há queixas de falta de pessoal, o que não pode deixar de ser muito grave e vir a penalizar-nos fortemente num futuro não muito longínquo. Claro que as baixas produtividades resultam de uma cultura instalada de falta de controlos e de chefias directas efectivas, com poderes de gestão, cultura que resulta também de políticas de facilidades instaladas, entre as quais a afirmação de que da passagem das 40 horas semanais de trabalho impostas pela troika na administração pública, como acontece no privado, se ter passado apenas para as 35 horas, com a afirmação de que não haveria não só qualquer problema, mas também qualquer acréscimo de custos, tudo constituindo-se numa utopia política e nunca numa gestão efectiva. Seria salutar que sobre esta problemática fosse feito o levantamento de quantos funcionários públicos nada produzem e ganham o vencimento por inteiro, muitos deles até estando em casa. Enfim, sempre os direitos, minimizando as obrigações, como se de tal fosse possível haver bons resultados. Para agravar a situação também o facto de se contrariar outros princípios impostos pela troika, entre os quais também se enquadra o aumento do número de feriados no país, tudo incentivando a baixas produtividades, privilegiando princípios de política sem consideração dos bons princípios de gestão.
Claro que esta cultura oportunamente instalada, nem sequer mereceu qualquer reparo da oposição, eventualmente porque pensam que perderiam votos de muitos funcionários públicos, o que revela bem as fraquezas do nosso sistema político, que nos vai conduzindo para situações complicadas. Aliás, tal está bem evidente no facto de recentemente termos perdido seis lugares na nossa posição no ranking das competitividades internacionais, o que revela bem que os nossos problemas são de âmbito global e não sectorial. Aliás por alguma razão se diz que o nosso 1º Ministro em 2024 tudo fará para ir para um lugar europeu, o que tem o seu significado e, na minha opinião, não será mau, na medida em que ele terá muitas dificuldades em inverter políticas que instalou e que nos conduziram para uma forte perda de produtividade e consequentemente de competitividade. Enfim, vamos ver para o que estamos guardados, mas as dificuldades hoje sentidas no nosso SNS são bem sintomáticas do que nos espera.