Edição nº 1812 - 4 de outubro de 2023

Valter Lemos
OS SERVIÇOS PÚBLICOS

Portugal saiu da crise pandémica melhor do que grande parte dos parceiros europeus e muito melhor do que todos vaticinavam. Os indicadores económicos que não eram tão positivos há largos anos, com Portugal a crescer bem mais do que a média europeia, ou seja, a convergir com a UE, o que já não acontecia há muito tempo. O salário mínimo cresceu 50% na última década e o salário médio cresceu menos, mas, apesar de tudo, melhorou cerca de 30%. Os orçamentos do estado passaram a ser equilibrados, o que permitiu um trajeto consistente de redução da dívida pública. Tal permitiu que a crise originada pela loucura de Putin com a invasão da Ucrânia catapultando a subida da inflação e a consequente subida dos juros, tivesse sido, em Portugal, apesar de tudo, razoavelmente contida com um conjunto de medidas de apoio e proteção. Tal não foi, ainda assim suficiente para debelar alguns dos efeitos, como, por exemplo, na habitação, onde a situação se tornou difícil de conter, afetando seriamente os jovens e as classes médias.
Mas, neste processo de combate a uma espécie de crise permanente, foram descurados os efeitos que as sucessivas crises e especialmente a da pandemia provocaram nos serviços públicos. Os casos da educação e da saúde são os mais referidos, mas os problemas destes setores, não deixando de ter também efeitos da pandemia, parecem emergir mais de aspetos estruturais como a falta de profissionais ou os regimes de trabalho utilizado. Mas o mesmo não se passa com outros setores da administração pública. Na verdade, os cidadãos têm vindo a sentir uma progressiva degradação dos serviços públicos, que se manifesta em diversos aspetos. O acesso a muitos serviços está manifestamente condicionado e restringido. Desde logo o atendimento presencial foi, em grande parte transferido para plataformas informáticas, excluindo, desde logo, os cidadãos com dificuldades funcionais no universo digital, como os mais idosos ou os menos escolarizados. Frequentemente as plataformas têm problemas de funcionamento, quer por imaturidade tecnológica, quer por deficiente manutenção, bloqueando o acesso dos cidadãos.
A alternativa de contacto telefónico é, na maior parte dos casos, fonte de desespero. Quem já experimentou contactar telefonicamente uma unidade de saúde, um serviço de justiça ou de finanças, uma escola ou um serviço de qualquer ministério conhece a sensação de o mundo ter parado e não haver ninguém que sequer atenda o telefone. Talvez só mesmo a PSP, a GNR e os Bombeiros parecem ter gente para atender o telefone aos cidadãos e ouvir as questões que os mesmos colocam. Há mesmo serviços que só têm disponível, para contactos ou pedidos dos cidadãos, uma plataforma informática, sem qualquer outra alternativa.
Tudo isto condiz a situações de grande desorganização da relação do estado com os cidadãos, o que estimula o aparecimento de intermediação selvagem e ilegal, como já acontece com a venda de senhas de atendimento nas lojas do cidadão e outros serviços.
Por outro lado, o feedback dos serviços públicos às solicitações dos cidadãos, para além de mais afastado, é notoriamente mais incompleto e menos competente do que já foi.
Também são notórios os problemas de administração e gestão dos grandes serviços públicos como o SNS, a Educação e a Justiça a que não são alheios os problemas derivados da degradação das condições de contratação, trabalho e carreira dos quadros superiores, especialmente dos dois primeiros casos, mas que é extensível a toda a administração pública.
Há, sem dúvida, uma crise na qualidade (e até na quantidade) dos serviços públicos e isso tem de merecer um programa político específico, sob pena de se perderem no processo de gestão pública os ganhos que o país conseguiu nos últimos anos.

04/10/2023
 

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