João Carlos Antunes
Apontamentos da Semana...
O MEU PAI, dono de um saber de experiência feito, dizia sempre que o ano bissexto era ano travesso. Também dizia que em ano bissexto a colheita cabia toda num cesto. Dir-me-ão que estes aforismos não têm qualquer base de saber científico, e eu concordo. Mas que quase sempre acertava, lá isso… Se se lembrarem do último ano bissexto, o 2020, foi um ano que ao Covid (que parece já tão distante) que testou o estado do nosso SNS, trouxe mortes e distanciamento nas relações sociais, criou um mundo quase distópico, se juntou um péssimo ano agrícola com seca, trovoadas e granizo que dizimaram a produção agrícola e até os nevões tardios não quiseram faltar.
Esta breve introdução às patifarias atribuídas ao ano que se atreve a ter mais um dia em que teremos de trabalhar ou sobreviver a todos os males deste mundo, serve para vos anunciar o meu pessimismo em relação ao que nos vai acontecer no bissexto 2024, passando mais para além do fundo da nossa rua. Um pessimismo que só com dificuldade consigo temperar com algum do otimismo militante (ou irritante, como agora se diz) que os meus amigos têm a bondade de reconhecer em mim.
Temos duas guerras sangrentas a acontecer, para além daqueles conflitos que só não existem porque (já) não têm espaço nas nossas televisões e jornais. Duas guerras de que se não vislumbra o fim. Pior, onde a lei do mais forte, seja Israel ou a Rússia, está a desenhar um desfecho que não vai ser bom para os palestinianos e ucranianos, como também para as democracias ocidentais, para a Europa em particular.
Este tremendo risco da democracia sucumbir, está também muito claramente desenhado no resultado das eleições americanas a acontecerem em novembro. Se a eleição de Trump em 2016 foi aquilo que se viu, na deriva antidemocrática, a forte possibilidade de voltar agora a ser eleito, vai ser catastrófica para a democracia e para as relações comerciais e de segurança entre os atuais aliados. Se nas eleições de 2016, o Mundo foi apanhado de surpresa pelos resultados, agora tem tempo até novembro para preparar estratégias e alternativas, como sugeriu esta semana o ministro Cravinho. Para um observador europeu, custa a acreditar no que está a acontecer ao Partido Republicano, dominado pela extrema direita mais radical e pelas ideias mais disparatadas veiculadas por organizações negacionistas e conspiracionistas como a QAnon. Mas o que se pode esperar de um país onde uma sondagem muito recente mostra que 50 % dos americanos entre os 18 e os 45 anos, não acredita que “a democracia seja a melhor forma de governação”?
2024 vai ser um ano de eleições um pouco por todo o mundo e Portugal também terá os seus momentos de dar a palavra ao povo. Não estavam no horizonte as legislativas, mas é a democracia a funcionar. Será uma campanha longa, não sei é se o tempo será bem utilizado para esclarecer, apresentar soluções alternativas, discutir programas e ideias, para que no momento de preencher o boletim de voto, o eleitor o faça em plena consciência da sua escolha. O que resultará das eleições, então o saberemos, sem dar muita importância aos vários estudos de opinião que, surpreendentemente, vão dando o PS como vencedor. O que mesmo um otimista moderado acredita, é que há muita probabilidade de resultar em instabilidade governativa. Tudo aquilo de que se alimenta o populismo.