Edição nº 1864 - 9 de outubro de 2024

José Dias Pires
OS AMADORES MAIS PROFISSIONAIS

Enfrentam os infernos das chamas, as águas tumultuosas das cheias e os frios intempestivos dos invernos rigorosos com igual denodo e coragem competente. Para salvar vidas alheias e em defesa de riquezas que não lhes pertencem, correm em direção ao perigo, enquanto outros correm na direção contrária. Sorriem para as mães e acarinham as crianças quando ambas se descobrem numa cabine de ambulância. Acompanham os doentes até onde for preciso como se fossem seus familiares. São quem chega primeiro a uma emergência e não pedem nada em troca quando partem.
Exercem a cidadania há mais de seis séculos. “Vida por vida” é o seu lema. E quantos a entregam devido aos indesculpáveis descuidos ou às criminosas intenções?
A prontidão e coragem dos bombeiros são admiráveis: estão sempre prontos para responder a chamadas de emergência de forma dedicada e comprometidos apenas com o servir a sua comunidade. São os primeiros a quem se recorre quando alguém se perdeu, quando se perde uma chave, se encrava uma fechadura ou um gato não consegue descer de uma árvore, apesar das suas sete vidas. Nos olhos de quem ajudam se espelha o seu sorriso ou a sua serenidade, quando lhes apetece o oposto. Sabem (demasiadas vezes) que as mãos que se estendem a pedir socorro, nem sempre se abrem em sinal de agradecimento e muito menos de oferenda.
Não sentem diferença entre a madrugada fria, ou o verão quente, porque entre a água e o fogo tudo se iguala ao som das sirenes.
Contudo, precisam de profundo respeito e reconhecimento permanente. Os bombeiros voluntários são o pilar central da nossa defesa civil.
Na verdade, a Lei Orgânica do Serviço Nacional de Bombeiros e Proteção Civil (SNBPC) pretendeu dar coerência, coesão e unidade a todos os elementos que se conjugavam, com maior ou menor empenho e eficácia, para responder às necessidades de prevenção e responder às mais diversas ameaças que surgissem dentro do seu âmbito de atuação. Contudo, o esforço legal e administrativo de nada serve se não se alterarem os conceitos estruturantes, se não se mudar, com clareza, a atitude política e fazer da proteção civil um sofisticadíssimo sistema de segurança em alto grau que mobilize toda a sociedade, reconhecendo, de facto, nos corpos de bombeiros voluntários, a defesa civil que é extensão profissional complementar das profissões de cada um.
Os Bombeiros Voluntários têm sido sempre a permanência da locução prepositiva do “em vez”, sem eles cada pessoa que morre sem ajuda, cada prédio que cai, cada floresta que arde, enquanto não tivermos a certeza que a prevenção e o socorro têm toda a atenção e meios necessários, serão crimes sem justificação nem desculpa.
E o que é a locução prepositiva do “em vez”?
Tão simplesmente isto: em vez de ir festejar com os amigos, de dormir em casa com os seus, de ter uma noite de repouso antes de um novo dia de trabalho, os amadores mais profissionais que conheço ficam ao dispor de conhecidos e desconhecidos que possam precisar de ajuda; em vez de ficar à lareira numa noite de inverno, escolhem o frio, vento e chuva e, se necessário for, em detrimento de um espaço refrigerado, no verão, não temem o calor infernal de um incêndio florestal.
Os Bombeiros Voluntários não podem continuar a ser submetidos a esforços que, demasiadas vezes, ultrapassam os limites da resistência humana havendo que acabar com a sua exagerada rotatividade que se tem revelado mais negativa que positiva. Organizados nas suas Associações devem assegurar a resposta normal na sua área de ação, em articulação com os bombeiros municipais (uma urgência que importa instituir e que conjugue bombeiros voluntários e sapadores profissionais).
Não sendo, naturalmente, a única razão da sua existência, o grande (e mais acidentado) desafio dos Bombeiros Voluntários são os devastadores incêndios florestais que poderiam caminhar para ser uma raridade, se houver presença humana nos campos, ocupação e normal limpeza da floresta, corta fogos naturais constituídos pelos terrenos agricultados, vigilância, deteção e fiscalização que aumentem o valor da floresta e explorem de forma inovadora a utilização do espaço florestal, tudo conjugado com uma gestão eficientemente dos meios de combate que garanta uma articulação de esforços entre todos os intervenientes.
O combate eficaz aos incêndios depende de uma base profissional permanente, caracterizada por muita dedicação e abnegação, mas acima de tudo por muito saber e experiência. Exige prática mas também muita teoria. No fundo exige escola, quadros qualificados capazes, não só de dirigir e formar os bombeiros profissionais, mas também de potenciar a generosidade e entrega dos voluntários, assegurando a eficácia da sua ação própria e a sua integração em operações conjuntas.
Reconhecer a existência dos Bombeiros Voluntários como os amadores mais profissionais do exercício da cidadania, deve obrigar-nos a concluir da necessidade urgente e inadiável de uma política sustentada de recrutamento para bombeiros sapadores profissionais, que deve começar desde já, e sempre, junto dos voluntários mais jovens que seja a base da constituição generalizada dos corpos de bombeiros municipais (amadores e sapadores profissionais).

09/10/2024
 

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