Elsa Ligeiro
CIDADES CRIATIVAS DA UNESCO EM CASTELO BRANCO
Gracias a la vida que me ha dado tanto… é o início de uma canção que marcou a minha juventude.
Por uma razão que o mercado dos discos na altura estabeleceu, a primeira vez que a ouvi foi na voz da norte-americana Joan Baez, numa gravação de 1974.
Só mais tarde conheci o original de Violeta Parra.
E com ela a descoberta de um Chile que no meu imaginário ainda era o das imagens do filme “Chove em Santiago”, pelo que a música e a poesia de Violeta Parra ganharam a forma do épico como representantes de uma América Latina que pouco a pouco fui conhecendo através da literatura.
O Chile, através das suas Cidades Criativas, esteve em Castelo Branco, no II Fórum Ibero-americano de Cidades Criativas da UNESCO.
E Fabíola Gonzalez, uma das convidadas, com a sua guitarra e voz deu eco ao lamento dos desvalidos; mas também nos ofereceu esse hino de Violeta Parra que continuará a unir povos que acreditam na solidariedade.
O universal conquista-se através da arte, escrevam isso com todas as palavras da vossa língua.
Chile também é a Patagónia, paraíso natural que alguns (poucos) têm o privilégio de visitar; e essas cidades criativas que a Unesco acolheu.
A Região de Los Rios esteve muito bem representada em Castelo Branco por Helena Urra, com quem troquei livros e ideias de comunidades literárias.
À Helena, e a muitos outros dos presentes no Fórum, tive oportunidade de mostrar mais de duas dezenas de autores nascidos no concelho de Castelo Branco; que, na minha opinião, representam a criatividade literária da cidade e do concelho.
Os livros também unem comunidades; como nos revelou na sua intervenção o Presidente do Município de Óbidos, uma Vila voltada para o livro e as suas possibilidades criativas.
Esqueceu-se o presidente de mencionar o grande obreiro de Óbidos Cidade Literária da UNESCO, o já falecido e saudoso livreiro, José Pinho; mas, seguramente, ele não se importará do esquecimento pessoal se o seu trabalho continuar em Óbidos.
Em Castelo Branco, os livros e a música uniram-se aos Chapéus de Montecristi, do Equador, que os artesãos locais continuam numa tradição admirável.
Seis meses pode demorar um chapéu a ficar pronto; seis meses de paciência e trabalho transmitido de geração em geração.
Em Montecristi já se criaram outros objetos mais comerciais a partir desse saber ancestral, mas é a elegância transformada em chapéu que provoca espanto a quem assiste à sua produção; como assistimos no CCCCB; permitindo-nos tocar o vegetal que servia ao artesão para o laborioso trabalho no chapéu que ainda se encontrava a meio da finalização.
Se, como nos dizia com graça popular o Vasco Santana: “chapéus há muitos”; apetece responder-lhe que sim, mas chapéu de Montecristi há só um.
E se há um pensamento a retirar deste II Fórum Ibero-americano das cidades criativas da UNESCO é que a melhor forma de falar de criatividade é vê-la aplicada no desenvolvimento regional.
Criar projetos integrados e ter a coragem para construir pontes, juntando em vez de excluir; e acolher com dignidade quem tem ideias e gosto pelo território onde reside.
A Cidade Criativa da UNESCO que Castelo Branco já é, só terá visibilidade se abandonar a sua organização apenas institucional e se abrir a outras parcerias que lhe podem ampliar a ação.
Pensar que uma ideia âncora como é o Bordado de Castelo Branco poderá só por si criar identidade a um concelho; é não entender o mundo competitivo em que se transformou o turismo e as artes criativas.
O fenómeno moderno do turismo necessita (para ter sustentabilidade) do património material e imaterial que se apresenta ao turista, chegue ele bem ou mal informado.
Oxalá Castelo Branco e todo o seu concelho adotem uma postura de valorização do território através da criatividade que promova a diversidade em várias valências; e que, bem aproveitadas, constituirão um valor económico considerável.
É necessário envolver as pessoas que conhecem bem o concelho e o saibam representar; através da construção de pontes entre povos, mas também entre as várias regiões do país.
Acabar com o exercício de um poder solitário, com embaixadas que se assemelham a uma vulgar guarda pretoriana, será escolher, finalmente, um modelo de desenvolvimento mais integrado da região; onde as comunidades residentes se reconheçam.