2 de novembro de 2016

Valter Lemos
O ALARGAMENTO DA ESCOLARIDADE OBRIGATÓRIA

A escolaridade obrigatória é hoje em Portugal de doze anos de duração, dos 6 aos 18 anos de idade. Assim, Portugal é hoje um dos países europeus (e mundiais) com a escolaridade obrigatória mais longa, só sendo acompanhado pela Holanda, pela Alemanha (em part-time) e mais recentemente pela Polónia. Esta situação era rigorosamente a inversa no início da década de 60 do século XX, quando se iniciaram os movimentos de democratização ou massificação escolar, quando Portugal tinha a mais curta escolaridade obrigatória da Europa (4 anos).
Esta inversão de posição não pode deixar de colocar desafiosacrescidos, dos quais o mais importante, num país com uma história de construção retórica e pouco efetiva do sistema educativo,é, não só à garantia da escolarização, mas também da escolaridade, ou seja, da efetividade das aprendizagens e dos resultados.
Esta questão, que já era muito relevante no caso português mesmo com uma escolaridade obrigatória mais curta, como provam os maus resultados de Portugal nos níveis de insucesso e desistência, torna-se crucial com o seu alongamento.
A presente extensãofoi proposta pelo Governo Sócrates e, apesar de tudo, aprovadana AR por unanimidade em 2009 em algumas condições mais favoráveis que as anteriores aprovadas em 1965 (seis anos) e 1986 (nove anos). Na verdade, o caminho a percorrer, em termos quantitativos, é menor. No primeiro caso (em 1965) a taxa real de escolarização dos 5º e 6º anos era apenas de 11,8% e a taxa bruta de 31,2% e no segundo caso (em 1986) a taxa real era de 41% e a taxa bruta era de 73,6% para o 3º ciclo do ensino básico (7º, 8º e 9º anos). Em 2009 a taxa real, no entanto,era já de cerca de 70% para o ensino secundário (10º, 11º e 12º anos) e taxa bruta ultrapassava largamente os 100%.
Mas, do ponto de vista qualitativo, este alargamento coloca alguns problemas mais complexos do que os anteriores, dos quais se podem enunciar a idade dos alunos abrangidos, a natureza do currículo e as relações com o mercado de trabalho. Assim, a idade dos alunos coloca novas questões às relações escolares, acompanhamento e orientação escolar e profissional pois há percursos anteriores mais extensos e maior maturidade dos envolvidos. Às escolhas das famílias juntam-se, agora com maior peso, as escolhas dos próprios alunos, que, muitas vezes, especialmente nas famílias com maior debilidade socioeconómica ou sociocultural, constituem verdadeiramente a única escolha.A escolaridade obrigatória longa torna-se uma gaiola dourada para muitos alunos e os processos de exclusão escolar ganham maior resiliência e os progressos obtidos não tornam a missão mais fácil, porque, apesar dos excluídos serem menos, a sua inclusão é cada vez mais difícil.
Por outro lado, nos casos anteriores a extensão da escolaridade assentava numa uniformização do currículo, enquanto no caso presente tal não é, de todo, desejável, nem verdadeiramente seria possível. Também anteriormente se tratava de ir preenchendo, com a escola, todo o período antecedente à entrada no mercado de trabalho, mas, tal escolaridade não se dirigia diretamente à preparação para essa entrada. Atualmente não é possível não ligar o cumprimento de uma escolaridade longa à entrada no mercado de trabalho. A solução agora assume a natureza rigorosamente inversa da anterior. Agora é indispensável diversificar o currículo quando anteriormente era necessário unificar o currículo.
Neste contexto, os desafios que se colocam ao alargamento da escolaridade são: a inclusão de jovens com percursos de abandono e a inclusão de jovens com necessidades educativas especiais, a qualidade das aprendizagens e dos resultados escolares, a orientação escolar e profissional, a diferenciação de percursos e a diversificação de alternativas curriculares e a ligação da escola ao mercado de trabalho.
Assim, é possível enunciar algumas propostas de medidas de política pública para responder a tais desafios: a instituição de dispositivos de acompanhamento de alunos, com o reforço do papel dos diretores de turma e diretores de curso e a criação de tutorias reais e efetivas, o desenvolvimento de um verdadeiro sistema de orientação escolar e profissional, com professores e técnicos especializados e articulado entre o Ministério da Educação e o Ministério do Trabalho, o alargamento das formações profissionais e profissionalizantes nas escolas e o alargamento das formações em contexto de trabalho e finalmente a criação de alternativas de escolaridade em part-time.
Sabemos que vivemos um tempo pouco favorável a reformas políticas e a medidas de grande impacto, mas, no presente caso também não se pedem grandes mudanças, mas, sim, continuidade e sensatez. O governo anterior foi, quanto a esses aspetos, pouco sensato, introduzindo diversas medidas que, ao contrário de estimularem percursos escolares mais longos, provocaram o aumento do insucesso e da desistência. Espera-se, pois, que o atual governo, mas, também os restantes partidos, atuem eficazmente, perseguindo adequadamente o caminho e os objetivos traçados em 2009 com medidas que apoiem os alunos e as escolas e professores a vencer estes novos desafios e a colocar Portugal finalmente no grupo dos países escolarmente mais avançados.
É, aliás, isso que o país mais precisa.

02/11/2016
 

Em Agenda

 
07/03 a 31/05
Memórias e Vivências do SentirMuseu Municipal de Penamacor
12/04 a 24/05
Florestas entre TraçosGaleria Castra Leuca Arte Contemporânea, Castelo Branco
14/04 a 31/05
Profissões de todos os temposJunta de Freguesia de Oleiros Amieira

Gala Troféu Gazeta Atletismo 2023

Castelo Branco nos Açores

Video