1 de agosto de 2018

Valter Lemos
PELA BOCA MORRE…

O vereador do Bloco de Esquerda na Câmara Municipal de Lisboa demitiu-se após a controvérsia gerada acerca do prédio de que é coproprietário naquela cidade.
Ricardo Robles, engenheiro civil, especialista em reabilitação e eficiência energética (de acordo com a suas próprias palavras), líder do grupo municipal do BE na Assembleia Municipal de Lisboa durante o mandato passado e vereador da respetiva Câmara no presente mandato, comprou à Segurança Social em 2014 um prédio por 347 mil euros. Nesse prédio viviam 5 inquilinos e existia um restaurante. O prédio foi reabilitado, gastando Robles e a irmã, cerca de 650 mil euros. O restaurante fechou, entretanto (desaparecendo 5 postos de trabalho) e os inquilinos saíram restando apenas um. Em 2018 o prédio, já só com uma fração ocupada em arrendamento, foi posto à venda por 5,7 milhões de euros (ou seja, com uma mais-valia superior a 4 milhões de euros).
Esta história nada teria de especial se um dos seus protagonistas não fosse o vereador do BE. Na verdade, o que ocorreu foi normal em situação de livre mercado imobiliário, ainda que se possa considerar que os valores de venda são manifestamente espe-culativos face aos valores de compra e de reabilitação. Mas, o vereador do BE distinguiu-se politicamente precisamente pela sua luta verbal contra o mercado livre imobiliário e contra a especulação.
No final de 2017, numa entrevista, Robles afirmava “A habitação é um dos maiores problemas de Lisboa… Uma medida essencial passa por tornar obrigatório que quando um prédio em propriedade horizontal vai ser construído ou reabilitado, o construtor saiba que tem de deixar uma percentagem de fogos para habitação a custos controlados pela Câmara Municipal de Lisboa. Nós defendemos que seja, pelo menos 25%”. (Repare-se que nesta data, o vereador já tinha reabilitado o seu prédio).
Esta triste história não é muito diferente da que, há alguns meses, ocorreu em Espanha envolvendo Pablo Iglésias, líder do “Podemos”, partido bem semelhante ao Bloco de Esquerda. O citado político comprou uma casa por 650 mil euros. Ato também aparentemente normal. Mas, o problema é que o referido Iglésias tinha afirmado, algum tempo antes, num inflamado discurso político, a propósito de um dos ministros do governo de então que havia comprado uma casa por 600 mil euros, que não se podia confiar num político que comprava uma casa por tal valor!
Como se vê, é muito fácil ser moralista na casa dos outros, é muito estimulante ser fundamentalista com as ações dos outros e é muito tentador ser demagogo com a política de todos.
No século XXI voltou a recrudescer em política o funda-mentalismo, o moralismo, a demagogia e o populismo. Muitos acham que tais tentações são só à direita, mas, a realidade mostra-nos que elas existem também à esquerda e em todo o espetro político, constituindo um risco e uma ameaça às democracias liberais.
Frutificaram partidos e movimentos “regeneradores” por essa Europa fora. Em alguns casos aliando ao fundamentalismo e ao populismo o nacionalismo e, na direita, a xenofobia.
Em Portugal, felizmente o populismo democrata de Marcelo desarmadilhou outros populismos e só o BE foi mostrando alguns tiques de partido regenerador, traduzidos num discurso politicamente moralista e em algumas atitudes politicamente per-secutórias. O BE quis afirmar-se como um partido “diferente”, com pessoas “diferentes” e posturas políticas “diferentes”, tudo assente numa moral política “diferente”. Pois, mas, afinal no momento fundamental defendeu a atitude e o comportamento de Robles até ao insustentável, ou seja, não podia ter sido mais “igual” aos outros.
Em quase todos os casos os discursos moralistas e fundamentalistas acabam por fazer baixas nos próprios. Torna-se difícil e até insustentável que todos os atores mantenham o seu comportamento e os seus atos tão política e moralmente “puros” quanto o seu discurso radical. Ricardo Robles como antes Pablo Iglésias são, pois, vítimas de si próprios. Não se mostraram nada “diferentes” dos que tanto atacaram nos seus discursos políticos.

01/08/2018
 

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