João Belém
A ÉTICA DO COTIDIANO
“Nosso caráter é o resultado da nossa conduta”
Aristóteles
Ética não é simplesmente uma questão de conhecimento. O mais importante é praticá-la. Viver eticamente exige não só a adoção consciente de uma perspetiva ética, mas também o compromisso com o desenvolvimento e a aplicação dos valores na nossa vida diária.
Quanto à questão de como colocar a ética em prática na vida cotidiana, seria útil considerar esse processo como tendo três aspetos ou níveis – cada um progressivamente mais avançado e dependente do anterior para existir sucesso.
Conforme descrito em alguns textos clássicos, estes três níveis são os seguintes:
- Ética da restrição – abster-nos deliberadamente de causar dano real ou potencial aos outros.
Por outras palavras, penso que a coisa mais importante que todos podemos fazer para minimizar os danos que causamos na nossa vida diária é agir com discernimento no nosso comportamento.
O sofrimento que causamos aos outros através de palavras pode ser muito subtil, mas não deixa de ser igualmente prejudicial. Isto acontece especialmente nos nossos relacionamentos mais próximos, mais íntimos.
Somos bastante sensíveis, e, por isso, é fácil causarmos sofrimentos àqueles que nos rodeiam através do uso descuidado de palavras duras.
Também podemos causar danos através da desonestidade, da calúnia. Todos nós já sentimos as consequências negativas das conversas fiadas. Elas minam a confiança e o afeto, criando vários tipos de mal-entendidos e inimizades.
- Ética da virtude – ativamente cultivar e fortalecer o nosso comportamento positivo e valores internos.
Através da presença mental, da consciência e da atenção, devemos abstermo-nos de prejudicar os outros com ações e palavras na vida cotidiana, e começar a concentrarmo-nos mais seriamente em praticar o bem de maneira ativa, podendo ser uma fonte de grande alegria e confiança interna.
Podemos beneficiar os outros através do nosso afeto e das nossas ações de generosidade, sendo caridosos e ajudando os mais necessitados.
-Ética do altruísmo – dedicar nossas vidas, genuína e abnegadamente, para o bem-estar dos outros.
Altruísmo é a dedicação desapegada e genuína das nossas ações e palavras para o benefício dos outros.
Profissões da área social, da área da saúde e da área da educação, estão envolvidas na busca deste terceiro nível de ética.
Estas profissões, que trazem benefício direto para a vida de muitos, são verdadeiramente nobres. O importante é simplesmente estabelecermos o serviço aos outros como nossa prioridade.
Para que sejam eficazes, estas três etapas devem ser consideradas em relação a todo o nosso comportamento. Por outras palavras, não apenas no que diz respeito às nossas ações físicas externas, mas também em relação ao que falamos e, em última análise, em relação aos nossos próprios pensamentos e intenções.
Entre esses níveis de comportamento – corpo, fala e mente – o mais importante é a mente, sendo ela a raiz de tudo o que fazemos e falamos.
Cabe aos jovens de hoje construírem um mundo melhor do que aquele que herdaram.
Muito está nas suas mãos. Tendo isso em conta, e também o facto de que uma mudança social efetiva só poder acontecer através do esforço individual, o fundamental na nossa estratégia para lidar com esses problemas deve ser a educação da próxima geração.
Espero que, um dia, a educação formal prestará atenção àquilo que podemos chamar a educação do coração. Assim como consideramos inquestionável a necessidade de adquirir competências nas áreas académicas, aguardamos a hora em que consideraremos inquestionável que as crianças aprendam, como parte de seu currículo escolar, a indispensabilidade de valores internos, tais como o amor, a compaixão, a justiça e o perdão.
Tenho esperança de que chegará o dia em que as crianças, como resultado da integração dos princípios da não violência e da resolução pacífica de conflitos na escola, estarão mais cientes dos seus sentimentos e emoções, e sentirão um maior senso de responsabilidade, tanto em relação a elas como em relação ao resto do mundo.