Edição nº 1725 - 19 de janeiro de 2022

Lopes Marcelo
ANTES QUEBRAR…

LPGRevisitar e celebrar a memória colectiva de uma comunidade representa uma atitude cultural nobre que dignifica o passado e ilumina de autenticidade o presente. É neste sentido que hoje evoco o testemunho de vida de um notável cidadão civicamente empenhado e exemplarmente dedicado à nossa cidade, o Dr. Luís Pinto Garcia, cujo lema de vida tomo por empréstimo para título desta crónica.
No passado mês de Dezembro associei-me à Direçcão da Sociedade dos Amigos do Museu Francisco Tavares Proença Júnior na deslocação a Vila Viçosa para participarmos na inauguração de uma exposição celebrativa da vida e obra do ilustre Calipolense, organizada pelo Centro de Estudos de Cultura, História, Arte e Patrimónios (CECHAP). Honrou, assim, Vila Viçosa a memória de um seu filho ilustre. Contudo, foi em Castelo Branco que o Dr. Luís Pinto Garcia viveu desde a sua juventude, já que o seu pai veio comandar o Regimento de Cavalaria da nossa cidade, nos anos vinte do século passado.
O então Major António Elias Garcia, para além da sua ilustre carreira militar, distinguia-se pela sua erudita formação cultural e dedicação à causa pública. Num tempo em que não existiam profissionais da Arqueologia ou da Museologia, António Elias Garcia sucedeu na direção do Museu Francisco Tavares Proença Júnior ao Dr. Paiva Pessoa em 1929. Foi neste ano que foi publicado o Decreto nº16  578 que institucionalizou o Museu como organismo do Estado, com a categoria de Museu Regional, mas com parcos meios e passando a ocupar uma das salas na Repartição da Obras públicas, ao lado do edifício do Governo Civil. Embora com um novo Regulamento (Decreto nº 17  927 de 06/02/1930) contemplava apenas um guarda, que se manteve como o único empregado nas quatro décadas seguintes. Para o Director era estipulada uma gratificação simbólica que mal dava para as estampilhas do correio e despesas de expediente. E foi, António Elias Garcia, dedicado Director do Museu, durante três décadas, até à sua morte em 1959. Sempre teve a colaboração, como seu braço direito, de seu filho, o jovem Luís Pinto Garcia que, na sequência da licenciatura em Ciências Histórico – Geográficas, regressou a Castelo Branco para se dedicar ao ensino e à investigação, tendo realizado a primeira pu-blicação: “Numismática dos portugueses que foram soberanos noutros países”, em 1937.
Na sequência do apoio incondicional à direção do Museu durante três décadas, o Dr. Luís Pinto Garcia reunia todas as condições para ser o digno sucessor na direcção. Na ausência de apoios quer do Estado central, quer da gestão municipal, ficou em 1959 fiel depositário das chaves do Museu. A título gracioso, em voluntária e generosa dedicação exerceu informalmente as funções, tudo fazendo para manter o Museu aberto a expensas próprias no período em que o poder político virou as costas ao Museu, já que só em 1963 foi nomeado o novo Director D. Fernando de Almeida.
Democrata convicto, o Dr. Luís Pinto Garcia nunca pactuou com o regime opressivo, tendo sido uma das vozes corajosas da oposição na Beira Baixa, destacando - se como representante da candidatura do General Norton de Matos e no apoio à célebre candidatura do General Humberto Delgado. O Poder político instituído retirou-lhe o diploma e proibi-o de exercer o ensino, quer nas escolas oficiais, quer nas privadas. Nada fez quebrar a sua notável dignidade e empenhamento cívico e cultural na dedicação em prol da sua comunidade. De facto, a par da sua total dedicação ao Museu, prosseguiu as suas investigações e publicações, designadamente: os estudos albicastrenses, “A Biblioteca Municipal, 1943”; “Museu Regional de Francisco Tavares Proença Júnior(breve descrição),1943; “Lápide sepulcral biface”, 1945; “Um Museu e um Director. Um corpo e uma alma”,1962; “D. João de Mendonça - o estudioso e o colecionador”,1978.
No seu campo preferido de investigação, a numismática, dando continuação ao labor de seu pai, ganhou o Dr. Luís Pinto Garcia uma notoriedade nacional e internacional, traduzida em mais de três dezenas de publicações especializadas que aqui não é possível assinalar, por falta de espaço. Foi sócio honorário da Sociedade Portuguesa de Numismática; sócio correspondente do Instituto Português de Arqueologia e Etnografia, entre outras.
Em 1975, com o primeiro Governo do Partido Socialista, em boa ora e com todo o mérito, tomou posse como Governador Civil do Distrito de Castelo Branco, cargo que exerceu com notável dedicação, isenção e empenhamento democrático de 18/10/75 a 14/02/80.
A memória resgatada de testemunhos de vida como é a referida ao Dr. Luís Pinto Garcia não pode deixar de nos interpelar para que seja devidamente dignificada e celebrada nos nossos dias. Necessitamos da pedagogia dos seus exemplos, dos seus valores e da luz fecunda das suas vidas.

19/01/2022
 

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