Joaquim Bispo
O LIVRO DE LABRÃO
(O Senhor aparecera a Labrão e anunciara-lhe que ia destruir Israel, pelo seu comportamento desumano.)
Continuação: De ocidente, lá onde ficava Telavive, levantavam-se grandes rolos de fumo negro irisado. Mas também a noroeste e a sudoeste. Labrão rasgou as vestes e prostrou-se por terra. Agora que Israel estava tão próximo de dominar todos os territórios de Canaã, acontecia uma catástrofe destas. Maldição!
Soube depois que, ao alvorecer, tinha chovido enxofre e fogo sobre as principais cidades de Israel, onde se localizavam as estruturas militares e administrativas do país, que ficaram reduzidas a cinzas brilhantes e fumegantes, sem que se conseguisse determinar a origem do bombardeamento.
Os sobreviventes dos colonatos e das pequenas localidades que não tinham sido atingidas, pareciam ter caído num estupor paralisante e mostravam-se incapazes de reagir à terrível reação dos palestinianos, que, armados de paus e pedras, se vingavam de dezenas de anos de espoliações, agressões e humilhações, chacinando quantos judeus encontravam. Toda a Cisjordânia foi limpa de colonatos, ainda nesse dia. Os Estados Unidos enviaram tropas paraquedistas, tentando estancar a matança e manter a colónia.
A seguir, apoiados em declarações antigas do Paquistão, atribuíram-lhe o ataque e, verberando o seu “espírito antissemita”, bombardearam-no intensa e extensivamente, fazendo-o recuar, tecnologicamente à Idade da Pedra.
A comunidade internacional declarou, pouco depois, a criação de dois estados desmilitarizados no espaço global da Palestina e de Israel, pelas fronteiras definidas pela ONU em 1948, mas, desta vez, asseguradas por forças de manutenção da paz. Entretanto, empenhava-se a reconstruir Gaza, terraplanada por Israel, e Israel, pulverizado sabe-se lá por quem.
Mas o espaço do antigo estado de Israel não era apelativo para os judeus do mundo inteiro, como fora antes. E os vários milhões de palestinianos, que tinham passado dezenas de anos em campos de refugiados nos países adjacentes, voltavam à Palestina à procura da casa dos seus antepassados e eram agora uma mole ameaçadora para qualquer veleidade judaica de reocupação.
Em sonhos, o Senhor apareceu de novo a Labrão. Este prostrou-se de imediato, de rosto no chão e implorou:
- Senhor Deus, Criador do Universo, tende compaixão do vosso servo que muito Vos ama.
- Não sejas palerma! Abraão e os teus outros antepassados aceitavam essa minha declaração, mas eram pastores e criadores de gado. Agora tu… Tu que já tens consciência do tamanho do Universo, diz-me: achas possível que um hipotético “Senhor Deus do Universo” prestasse atenção a um grupúsculo étnico e o convencesse que é o suprassumo dos viventes?
- Mas, Senhor, se não sois quem dissestes, quem sois Vós?
- Aos teus antepassados disse que fora Eu o Criador do Universo - era o que estavam preparados para ouvir; a ti digo que sou um visitante do futuro. É a explicação para que estás preparado.
Labrão abriu muito os olhos.
- Nunca tinha pensado nessa hipótese…
- A minha natureza é complexa. Talvez outros homens venham a estar preparados para outra explicação…
Labrão acordou, alagado em suor. Levantou-se, fez as abluções rituais e prostrou-se em oração, tentando reprimir uma animosidade por este Deus que não reconhecia. Em vão.
«Visitante do futuro? Aldrabão! Um dia, o verdadeiro Deus voltará. Que pena os serviços de espionagem não terem detetado a entrada no país deste terrorista. Deviam tê-lo bombardeado antes que atacasse Israel!»