Valter Lemos
A OCDE E O ESTADO DA EDUCAÇÃO EM PORTUGAL
A OCDE é uma organização surgida no pós-guerra mundial com a finalidade de coordenar os esforços de reconstrução económica da Europa. Desde o início adotou as teorias do capital humano como base da sua doutrina socioeconómica, o que a levou a desenvolver grandes esforços na análise das políticas públicas e designadamente do papel da educação no crescimento económico.
Hoje a OCDE é talvez a organização internacional com mais conhecimento e influência no estado e no desenvolvimento de políticas educativas em todo o mundo.
Essa situação foi construída através de dois instrumentos essenciais: o PISA (Programme for International Students Assessment) e o Education at a Glance.
O primeiro é um teste que mede as competências dos alunos com 15 anos de idade nas áreas da leitura, matemática e ciências. Realiza-se a cada 3 anos e permite comparar os resultados dos diversos países e estudar a relação com outros indicadores e as políticas educativas. O segundo é um relatório anual sobre um largo conjunto de indicadores dos resultados, meios e atores educativos, permitindo, para além da comparação entre países, verificar a evolução de cada país ao longo do tempo.
No mês passado foi publicado o Education at a Glance 2020. O que nos diz ele sobre Portugal?
O relatório analisa 25 grupos de indicadores e tem perto de 500 páginas, pelo que vamos só referir alguns breves aspetos.
- Portugal investe menos na educação, por aluno/ano, do que a média da OCDE (10220 contra 11231 dólares). No ensino básico e secundário a diferença é pequena (9836 para 9999 dólares), mas no ensino superior a diferença é enorme (11788 para 16327);
- Na educação de infância Portugal tem uma taxa de envolvimento nas primeiras idades superior à média da OCDE (para crianças de 1 ano de idade 42% contra 34% e aos dois anos de idade 56% contra 46%);
- Também no grupo 3-5anos Portugal tem uma taxa de 91% contra 88% da média da OCDE;
- Portugal tem menos alunos no ensino profissional e vocacional que a média dos restantes países (26% para 32%);
- Em Portugal no grupo etário 24-34 anos 37% das pessoas têm um curso superior e a média da OCDE é de 45%, mas Portugal cresceu 14 pontos percentuais na última década e a média da OCDE só cresceu 9 pontos;
- No mesmo grupo etário a percentagem de mulheres com curso superior (45%) é maior que a dos homens (29%), tal como na OCDE (51%/39%);
- A taxa de emprego para os portadores de ensino superior em Portugal é igual à do ensino secundário (86%) e na OCDE é maior (85%/78%), mas o diferencial salarial dessas qualificações é maior em Portugal (69%) do que na média da OCDE (54%);
- O número de professores dos ensinos básico e secundário, com menos de 30 anos, em Portugal, nos últimos quinze anos caiu 15 pontos percentuais é atualmente de 1% do total e na OCDE caiu 4 pontos sendo atualmente de 12% do total;
- Os salários médios dos professores são 2 a 10% mais baixos em Portugal, exceto na educação pré-escolar onde são cerca de 20% superiores.
Estes são alguns dos dados revelados no relatório de 2020. Como todos os dados permitem variadas interpretações, podendo ver-se o “copo meio cheio” ou “meio vazio”, mas creio que há dois ou três aspetos bem relevantes. Primeiro, o progresso feito no acesso à educação de infância. Apresentar taxas de frequência superiores à média, num país que nas décadas de 70 e 80 do século passado tinha os piores indicadores da Europa, é, sem dúvida, extraordinário. Segundo, a continuação da ainda baixa taxa de participação nos ensinos profissional e vocacional, apesar dos intensos esforços feitos principalmente na primeira década deste século. Em terceiro lugar o gritante envelhecimento dos professores em Portugal. Só 1% tem menos de 30 anos!! Por fim, o diferencial de investimento no ensino superior relativamente aos outros países, que ajuda, sem dúvida, a perceber o estado lamentável em que se encontram muitas instituições de ensino superior. Portugal quer aumentar as estatísticas de frequência do ensino superior, mas não quer gastar dinheiro com isso. Para isso dualiza o sistema, subfinanciando uma parte que parece existir para garantir as taxas, mas não para garantir a qualidade da formação.
Urgem, pois, políticas de renovação do corpo docente em todos os níveis de ensino e urge uma alteração da política de dualização do ensino superior que condena muitas instituições e dezenas de milhares de jovens à pobreza pedagógica e à subqualificação.